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quarta-feira, 18 de junho de 2014

A COLHEITA DA FAZENDA - Escola Fundamar: uma experiência premiada de Educação Infantil no campo (Pedagogia Investigativa)





APRESENTAÇÃO



Todo dia, cerca de 2,3 milhões de estudantes que vivem no campo são
transportados para as cidades rumo às suas escolas. Apenas 33%, segundo o
Censo Escolar 2002, estudam em escolas localizadas na zona rural. Muitas
dessas escolas estão mal aparelhadas – aproximadamente 44 mil delas nem
sequer possuem energia elétrica – e o desempenho de seus alunos tem se revelado
inferior aos que estudam na zona urbana, segundo as últimas avaliações feitas pelo
Ministério da Educação. O fato de o Brasil ser um país imenso, com 22% de sua
população infanto-juvenil vivendo no campo, torna ainda mais necessária a oferta
de ensino público de qualidade além dos limites das cidades, principalmente na
Educação Infantil, pois 67% das crianças brasileiras entre zero e seis anos se
encontram fora da escola. No campo, a pouca oferta piora esse quadro de exclusão.
Temos, portanto, um problema a enfrentar.
A Fazenda Escola Fundamar ganhou o Prêmio Criança 2002 da Fundação
Abrinq, na categoria Educação Infantil, por apresentar uma proposta que enfrenta
simultaneamente dois dos maiores desafios da educação no campo: qualidade e
garantia de transporte para a população atendida.
Criada pelos proprietários da Fazenda Santa Rita, no sul de Minas Gerais, com
apoio dos municípios de Machado e Paraguaçu e da Secretaria de Estado da
Educação, a Fundamar construiu, ao longo de duas décadas de existência, uma
respeitável consistência pedagógica. O papel destacado da memória, a valorização
da vida comunitária e dos saberes próprios daqueles que vivem na região, a
participação ativa dos pais na aprendizagem de seus filhos, a oferta de período
integral com cinco refeições diárias e oficinas de arte, o incentivo à criação do
material didático pelos próprios alunos e uma organização curricular
contextualizada fazem dessa experiência um estudo de caso a ser analisado,
debatido e aplicado. Sempre com as necessárias adaptações a cada contexto, como
recomendam as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do
Campo, editadas pelo Ministério da Educação:“a identidade da escola do campo é
definida pela sua vinculação às questões inerentes a sua realidade”. Ou seja, a
cada campo, uma escola que faça sentido a quem nele vive.
Nossa intenção ao publicarmos esta experiência é que mil outras escolas como
a Fundamar proliferem pelo país, como boas plantações. E que deem seus frutos na
forma de cidadãos conscientes e orgulhosos de serem o que são: homens que
vivem no campo e dele extraem sustento e orgulho.
Boa leitura.

Rubens Naves
Diretor-presidente da Fundação Abrinq
pelos Direitos da Criança e do Adolescente


“É notável a mudança nas crianças. Muitas chegam

desnutridas, pouco sociáveis, arredias. Algumas têm até o olhar

triste. Mas, passados alguns dias, elas começam a brincar, correr,

pular... ficam amigas umas das outras. Enfim, se tornam crianças

felizes. Com isso, ganhamos todos. A criança, um ambiente

saudável para seu desenvolvimento. A família, tranquilidade e

tempo para trabalhar. E nós, educadores, a gratificação de poder

contribuir de alguma forma para o desenvolvimento dessas

crianças.” (Janete de Souza Rocha, professora de Educação Infantil

da Escola Estadual Fundamar)
 

INTRODUÇÃO

Criada pela Fundação 18 de Março, em 1984, a Escola Estadual Fundamar atua
no município rural de Paraguaçu, em convênio com a Secretaria de Educação de
Minas Gerais. Desde o início, a escola se ergueu olhando nos olhos da população
local, reconhecendo-a como protagonista de uma história rural com tempo, espaço
e enredo próprios – muitas vezes desprezados pelos modelos urbanos. Ano a ano,
construiu uma proposta pedagógica inovadora, baseada na investigação e
construção da memória, da identidade e do conhecimento. Dentro e fora da sala de
aula, a criança encontra a oportunidade de viver uma infância plena, com tempo e
espaço para brincar, fazer amigos, explorar o mundo físico e imaginário e buscar
diferentes formas de expressão.
Para que o projeto pedagógico se concretize de fato, há um investimento
contínuo na formação de seus profissionais, adaptação do espaço físico e
elaboração de material escolar adequado ao contexto. Desde cedo, a Fundamar
também compreendeu a importância de promover a proteção integral da criança,
envolvendo a família, a comunidade e o poder público na garantia dos direitos
básicos da infância, como transporte, alimentação e saúde.
No decorrer de 2003, essa prática pedagógica tornou-se matéria-prima de um
cuidadoso processo de sistematização, que resultou nesta publicação. A Escola
Estadual Fundamar participou, assim, de um novo desafio assumido pela Fundação
Abrinq a partir do Prêmio Criança 2002: sistematizar as experiências vencedoras
para que sejam disseminadas pelo país ou, ainda, inspirem mudanças nas políticas
públicas.
A pedagoga com especialização em psicologia social Maria Lúcia Gulassa
visitou o local, observou espaços e rotinas, consultou os registros existentes e
realizou entrevistas individuais e coletivas com membros da equipe.Também foram
organizados encontros com os educadores, monitores, supervisores, mães e
assistentes sociais.
No processo de sistematização dessa experiência pedagógica, o grupo pôde
refletir sobre suas práticas, definir conceitos e organizar saberes a fim de melhorar,
potencializar, compartilhar e disponibilizar a experiência para que outros possam
aprender com ela. A partir de temas como “Quem é a população rural?”,“Qual é o
futuro dessa população?”,“Qual é a importância da creche no campo?”,“Quem é o
ser humano que queremos formar?”, o grupo teve a oportunidade de expressar seus
pensamentos, confrontar ideias, aprofundar reflexões e produzir textos coletivos
como registro desta trajetória.
Antes de enfocar especificamente o projeto de Educação Infantil da Escola
Estadual Fundamar, é importante falarmos sobre a origem e o desenvolvimento da
proposta pedagógica que norteia a iniciativa.Também merece atenção o contexto
cultural e social das famílias atendidas. Ao ver, ouvir e sentir as crianças e os
educadores, o impacto deste trabalho se revela e contagia. E esse contágio nada
mais é que o primeiro passo para a esperada disseminação dessa experiência bem sucedida
de Educação Infantil no campo, uma etapa desafiadora e decisiva para o
bom desenvolvimento da criança.
A Escola Estadual Fundamar é um projeto de educação instalado no município
de Paraguaçu, que atende também crianças de Machado – ambas áreas cafeeiras
do Sul de Minas Gerais. Criada em 1984, a escola conveniou-se, cinco anos depois,
à Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais. Hoje atende cerca de 500
crianças, da Educação Infantil ao Ensino Fundamental. São meninos e meninas
moradoras da zona rural e periferia das duas cidades, com idades entre 18 meses e
16 anos.
Mesmo com defasagem idade/série, nenhuma criança que vive no campo e
solicita matrícula é rejeitada pela escola. Afinal, a Fundamar nasceu justamente
para garantir o acesso dessas crianças à educação. Muitas delas não estudavam
porque não tinham como chegar até a cidade mais próxima.Também houve uma
especial atenção no sentido de criar uma escola que atendesse e respeitasse a
cultura do campo, sem reproduzir preconceitos ou currículos esvaziados de sentido
para aquele grupo. Comumente, depois de uma empoeirada caminhada, a criança
moradora do campo que chega à escola da cidade é rejeitada pelos colegas por
ser diferente,“da roça”. Sem ter as mesmas bases culturais previstas no currículo,
também não encontra seu lugar na rotina pedagógica. Acaba, então, sendo excluída
da escola, levando consigo a sensação de que é incapaz ou de que não faz parte
do grupo.
Atenta a essa realidade, a Fundamar se propôs a fazer um atendimento
baseado na valorização e no fortalecimento da identidade da comunidade local.
Construiu um projeto pedagógico próprio e tornou-se referência na região. Cuidados
e protegidos, seus alunos têm a oportunidade de vivenciar um rico contexto de
formação cultural e aprendizagem participativa e instigante.
A seguir, algumas características marcantes do projeto pedagógico da escola:
Atendimento integral
Contrariando a mentalidade de que a população que vive no campo prefere
seus filhos no trabalho a tê-los na escola, os alunos da Fundamar passam oito
horas diárias na escola. Além da escolarização formal, são oferecidas oficinas
culturais, como artesanato em fiação, tecelagem, bordado, tricô, cerâmica, cestaria
em palha, horta, marcenaria, aulas de música, biblioteca, recreação, datilografia e
informática. A escola também garante transporte para todas as crianças e
professores, cinco refeições diárias e encaminhamento médico e odontológico.

Ponto de encontro

Segundo a supervisora das oficinas e assistente social da Fundamar,Maria
Lúcia Prado Costa, o maior atrativo da escola, para as crianças, não é o transporte
ou a alimentação.“É o interesse em se encontrar”, afirma. A instituição tornou-se
ponto de encontro, um verdadeiro polo cultural no meio da roça.


A PROPOSTA DE TRABALHO

Convívio afetuoso

Os professores dizem gostar muito de trabalhar na escola. Afirmam que é
melhor do que trabalhar na cidade ou em qualquer outro lugar, com qualquer outra
população.Mas não lhes parece fácil explicar o porquê. Ficam se perguntando o
que há de tão especial. A primeira razão que surge é o jeito de ser dos alunos,
“receptivos, carinhosos, gentis”. Todos valorizam e respeitam os professores. Desde
bem pequenos, são cooperativos e companheiros entre si.

Acolhimento e troca

Outro ingrediente importante do ambiente escolar citado pelos professores é a
postura dos próprios adultos. Os mestres descrevem um clima de acolhimento,
potencializando a oportunidade de troca e aprendizagem. Para os profissionais da
educação, essa atitude contribui para que a escola seja realmente “construtivista”,
pois permite que crianças e professores estejam mais livres para construir e
reconstruir seus conhecimentos de forma significativa.

Metodologia investigativa

A metodologia investigativa também se revela como característica marcante da
escola. Continuamente, a equipe se propõe a conhecer as crianças, suas famílias, as
características da população rural e as formas como constroem seu pensamento.
Prevalece a concepção de que o conhecimento não está pronto ou acabado,
mas em constante movimento, sendo construído por todos – supervisores,
professores e alunos. Produzindo textos, elaborando mapas,maquetes ou jogos,
estudando as mudanças em si próprios e no contexto, todos produzem saberes.
“Quem somos?”“De onde viemos?”“Quais são as nossas dificuldades?”“O que
queremos?”“Como é nosso espaço?” São perguntas, entre tantas outras,
constantemente investigadas, discutidas, respondidas e registradas pelas turmas.

Tesouro da memória

Em busca de um sentido verdadeiro para a educação de crianças do meio rural,
a Fundamar descobriu a necessidade e a riqueza de trabalhar com as noções de
pertencimento, identidade, protagonismo e possibilidade de ser. Esses temas foram
assumidos como principal metodologia do trabalho, por meio da inserção da criança
no tempo e no espaço. A preservação da memória e da história é compreendida
como um processo de construção de identidade e pertencimento sociocultural,
intimamente ligado às características do espaço em que se vive.

Produção de conhecimento

Todos os alunos e professores são envolvidos na produção permanente de
conhecimento. Em vez de usar o material didático convencional, por exemplo,
tornam-se autores dos Cadernos de Estudos Sociais, que já são referência nas
escolas da região.
“Gostaria que nossos meninos e meninas saíssem da escola com um sentimento de alegria
pela vida, acreditando que o empenho em construir o mundo vale a pena. E mesmo quando as
coisas se tornarem difíceis, as portas se fecharem, às vezes injustamente, que eles se
apeguem ao sentimento de que têm sorte na vida: afinal tiveram uma escola que era a mais
bacana do pedaço.”
Maria Lúcia Prado Costa, assistente social e coordenadora das oficinas
Em paralelo, para permitir o livre acesso ao conhecimento acumulado, a escola
criou uma biblioteca com variados títulos de Literatura, Arte e História. Além disso,
mantém um banco de dados constantemente alimentado por todos os participantes
da escola e da comunidade, para que escrevam, desenhem ou fotografem.Tal banco
constitui-se, assim, em um acervo inédito e valioso sobre a vida e a cultura da região.


ESCOLA RURAL OU DO CAMPO?

No debate atual sobre educação para a população rural, está implícita a
necessidade de se reconstruir no imaginário coletivo uma nova visão do
campo, pois ainda é dominante a concepção do campo como um lugar de
atraso, prosaico, inferior à modernidade da cidade, sem futuro.
Nesse sentido, alguns teóricos da educação defendem o uso da expressão
“campo” em substituição ao “rural”, com o sentido de concebê-lo como um
espaço de vida e resistência, que contempla o modus vivendi do homem do
campo, respeitando as diferenças e especificidades de cada povo que nele
habita, um ethos engendrado nas relações interpessoais desse contexto.Nas
palavras de Bernardo Mançano Fernandes, o conceito “campo” expressa um
“espaço social com vida, identidade cultural própria e práticas compartilhadas
por aqueles que a vivem”, enquanto o “rural associa-se ao espaço territorial,
demarcador de área”.


O conceito de “campo” foi inicialmente introduzido pelos movimentos

sociais do campo e vem sendo incorporado também por alguns órgãos

governamentais envolvidos na discussão sobre as diretrizes para uma

educação do campo. Com isso,mais do que mudança de terminologia,

pretende-se reconhecer os valores e saberes próprios dessa população, que

sempre viveu à margem de seus direitos. Como estratégia de inclusão social, a

educação do campo também deve ser pensada articulada a um projeto de

desenvolvimento sustentável para quem nele vive. (Marcia Regina Andrade, doutora em Ciências Sociais aplicadas à Educação pela Universidade Estadual de Campinas – Unicamp)



A ESCOLA NO TEMPO

Atual coordenadora da Escola Fundamar, a fonoaudióloga Creusa Prado
Ornellas faz parte da história da instituição desde quando ela era apenas uma
ideia.“Tudo começou porque pessoas se encontraram e se arriscaram. De diferentes
maneiras, não tiveram medo de ser pioneiras, generosas e solidárias”, lembra.
Proprietária de uma das fazendas da região, a Fazenda Santa Rita, Dona
Creusa percebeu que as crianças do local e arredores não frequentavam a escola
da cidade por falta de transporte. Em um primeiro momento, junto com os demais
proprietários da fazenda, decidiu providenciar a condução.Mas o grupo constatou
que, mesmo assim, o índice de evasão escolar continuava alto. Começaram, então,
a pensar na criação de uma escola que acolhesse melhor às especificidades da
criança do campo.
Em 1978, o cunhado de Dona Creusa e sócio na fazenda, o advogado Túlio
Vieira da Costa, havia criado a Fundação 18 de Março, com o objetivo de dar apoio
jurídico à população local, que não tinha acesso à Justiça. Contagiado pela
preocupação com a educação das crianças, ele concedeu autorização em
comodato para que uma área das terras fosse utilizada no desenvolvimento de
atividades educativas. Posteriormente, ocorreu a doação definitiva da área.

Primeiros anos

O entusiasmo foi crescendo, e Dona Creusa começou a elaborar um projeto de
educação no campo. Informada de que não poderia desenvolver uma escola sem
autorização da delegacia de ensino, procurou a então delegada da
Superintendência Regional de Ensino de Varginha, Lídia Foresti, que se interessou
pelo projeto e autorizou a formação da escola, cedendo uma professora e uma
funcionária de apoio, além de algumas mesas e cadeiras. Assim iniciou-se, em
1984, a Escola Estadual Fundamar, uma iniciativa da Fundação 18 de Março, com o
apoio da Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais.
Com a colaboração financeira de um vizinho, um antigo barracão da fazenda
foi reformado para abrigar a primeira turma da escola. Era uma única sala para
todas as séries. Um mês depois, 27 alunos já frequentavam a sala pioneira.
No ano seguinte, formaram-se turmas até a 4a série, e cada uma ganhou sua
própria sala. Apenas as crianças entre quatro e seis anos continuaram num espaço
conjunto. No segundo semestre, foram iniciadas as primeiras oficinas artísticas,
incluindo retalho, fiação, cerâmica e horta. Com o apoio da Secretaria de Educação,
artistas e artesãos da região foram contratados como monitores.

Sonho coletivo

O sonho de construir uma escola diferente começou a atrair novos
colaboradores. Creusa Ornellas conta com carinho do pesquisador austríaco Franz
Leher:“Quando isso aqui ainda era um grande pasto, ele se sentou num toco de
árvore, fechou os olhos e sonhou. Sonhou com um espaço cheio de meninos e
meninas correndo. Imaginou as crianças casando e trazendo seus filhos. Hoje já
temos os filhos e logo teremos os netos”. Especializado em agricultura orgânica,
Franz Leher morou na fazenda, iniciando ali, aos 80 anos de idade, o projeto da
horta orgânica e do cultivo de macadâmia – uma castanha natural da região Norte,
de alto valor nutritivo.
As colaborações nesse período inicial foram as mais variadas possíveis, lembra
Creusa:“Havia um motorista de caminhão, Sr. José Messias de Melo, que esperava
até as 10 horas da noite para levar para casa os funcionários da fazenda depois do
curso noturno de alfabetização de adultos. Percebendo o esforço de todos, ele se
negava a cobrar, dizendo que também queria colaborar e dar um pouco de si”.
Entre tantos outros, Creusa também fala de sua sobrinha, a assistente social e
historiadora Maria Lúcia Prado Costa, que começou a trabalhar na escola, quando
foi inaugurada, em 1984. Em 1991 ela foi morar na fazenda e, no ano seguinte,
assumiu a coordenação das oficinas. Em seguida, começou a desenvolver a
metodologia dos Cadernos de Estudos Sociais – marco fundamental na pedagogia
da escola.



MARCOS DA ESCOLA FUNDAMAR


1968 - Surgimento da Fazenda Santa Rita, no município de Paraguaçu (MG).

1978 - Criação da Fundação 18 de Março.

1983 - Garantia de transporte para as crianças da Fazenda Santa Rita

frequentarem a escola da cidade.

Início das atividades educativas com as crianças em uma área

reservada da Fazenda Santa Rita.

1984 - Criação da Escola Estadual Fundamar, com turmas de Educação

Infantil a 4a série.

1985 - Início da parceria com a Secretaria de Educação de Minas Gerais.

Início das oficinas culturais na escola.

1989 - Formalização do convênio com a Secretaria de Educação de Minas

Gerais.

1993 - Início das turmas de 5a a 8a série do Ensino Fundamental.

Produção dos primeiros Cadernos de Estudos Sociais.

2003 - Início da parceria com a Rádio Objetiva I, com divulgação de projetos

e temas trabalhados na escola e informes da Pastoral da Criança em

um quadro fixo no programa semanal “Objetiva Notícias”.


A ESCOLA NO ESPAÇO

A Escola Estadual Fundamar situa-se em uma ampla área verde, com casas,
plantações, pastos, açudes, cerrados e matas preservadas. No total, são 80 hectares,
originalmente pertencentes à Fazenda Santa Rita. A serenidade da arquitetura se
soma à beleza das colinas, córregos e cerrados. Professores e alunos acham a
Fundamar um local bonito e bem cuidado. Em nenhum lugar se veem lixo, papel no
chão, latas ou garrafas. Ao mesmo tempo, não existe nada de luxuoso ou supérfluo.
Espaços acolhedores
A escola espalha-se por várias casas que pertenceram a colonos, algumas
delas sem forro, com o telhado visível e chão de cimento queimado. Em cada uma
funciona uma sala de aula, com dois banheiros quase sempre externos.Todas são
identificadas por uma placa pendurada no teto ou na porta com o nome do espaço,
facilitando a comunicação visual dos visitantes e fazendo a linguagem escrita,
quase ausente na zona rural, ganhar importância.
Dentro da sala, tudo o que é necessário está presente:mesas e cadeiras,
quadro negro, estantes para livros, espaço para as crianças se movimentarem e
exibirem suas produções. Quadros de aviso informam as novidades, como as festas
do mês ou a visita de ex-alunos.
No centro do terreno, um grande carramanchão redondo, com paredes baixas
em forma de caracol, serve de espaço de encontro. É usado para lanche, reuniões
com os pais, brincadeiras protegidas do sol e da chuva.Também há quadras de
esporte e jogos.
O espaço de música é um antigo celeiro de milho, acima do nível do chão,
numa construção tipo palafita, com uma escadinha de madeira dando acesso ao
assoalho de tábuas. No seu interior, aparelho de som, berimbau, quadro negro –
cenário onde as crianças soltam a voz, mexem o corpo, acompanhando o violão
tocado pelo professor.
Bem próxima, fica a sala onde as crianças pequenas desenvolvem suas
atividades. Há ainda a casa de artes e ofícios, a marcenaria, a oficina de cerâmica, a
de cestaria e a de computação.

Presença da natureza

O espaço pedagógico, entretanto, não se limita às salas de aula, estendendo-se
pelas sombras das árvores. Sempre que o clima permite, as atividades acontecem ao
ar livre. No geral, as crianças passam pelo menos metade de seu tempo debaixo das
árvores, na horta, no parque ou no campo de esporte.
Acompanhando as estações do ano, as árvores, flores e colinas se pintam de
diferentes tons de verde, vermelho, amarelo. A vida no campo se faz presente.
Olhando em frente, a vista vai longe. Nas pequenas colinas, um rebanho de vacas
leiteiras pasta tranquilamente. De vez em quando, avista-se uma carroça na estrada.
Cenas que tomam conta do imaginário das crianças e se integram, de maneira quase
imperceptível, à aprendizagem diária.



O Cerrado


Texto produzido por João Ernesto Campos Prado, monitor da horta

da Escola Fundamar, e publicado nos Cadernos de Estudos Sociais.


Até o ano de 1970, onde hoje está localizada a Escola Estadual Fundamar, era uma área de cerrado, mais

conhecida por cerrado do Braguinha. Esse cerrado era em terras que por muitas e muitas décadas foram

improdutivas. Uma pequena fatia do imenso cerrado que existia entre Paraguaçu e Machado.

Apesar de serem terras desacreditadas, eram muito ricas em água, flora e fauna, que serviam para o sustento

de muitas famílias. Suas águas são profundas de grandes nascentes cristalinas e com elas são feitos lindos açudes

com diversas qualidades de peixe: mandi, traíra, cará, carpa e tilápia. Tem também um pequeno rio, que atravessa

essas terras, conhecido por rio Machado. Sua nascente é em Silvianópolis. Ele corta as terras de S. João da Mata, a

cidade de Machado, atravessa nos fundos do Bairro Chico dos Santos e desagua na represa de Furnas a poucos

quilômetros acima da ponte entre Paraguaçu e Alfenas. (...)

A flora do cerrado era formada por pequenos arbustos: araçá-de-porco, candeinha, ipiúna, peito-de-pomba,

angico e cambuí, que eram cortados para o uso de mourões no feitio de cerca; o barbatimão cuja casca era explorada

para ser vendido em curtumes para o curtimento de couro; o maroleiro que só servia para a produção do marolo que

foi fruto tradicional da região. Tinha também árvores de grande porte, a maçaranduba, óleo de cupaíba, jatobazeiro,

angazeiro e figueira.

A fauna era formada pelo Lobo-Guará, Cachorro-do-Mato, Tatu, Lontra, Jaguatirica, Paca, Veado, Capivara e

muitos outros.

Em 1970, chegava ali a Firma Sociguaçu, pioneira do desbravamento daquele cerrado, que com grandes máquinas

de esteira iam derrubando e enfileirando e no lugar destes pequenos arbustos faziam grandes plantações de eucaliptos.

E está aí hoje a Fundamar, esta escola que ensina e educa a crianças da comunidade vizinha, Bairro dos Alves,

Macuco, Chico dos Santos, Castilho, Tavares, Pica-pau, Papagaio e Ouro Verde.

E ao seu redor hoje podemos ver grandes plantações de milho, feijão, mandioca, batata, arroz e o café que duas

décadas atrás eram produzidas em cultura.



O UNIVERSO RURAL

Além da paisagem natural, a escola busca decifrar e valorizar o cenário cultural
ao qual pertence, ou seja, o ambiente rural mineiro. Durante o processo de
sistematização, nas investigações sobre quem seria este homem do campo, os
educadores olharam para fora, analisando as comunidades rurais, e para dentro de
si mesmos, para suas infâncias, seus pais e avós. Nesse processo, vieram à tona
emoções, reflexões e análises importantes.

Preconceito

A primeira situação percebida foi o preconceito em relação à população que
vive no campo. Os educadores logo questionaram:“Por que criança rural? Criança é
criança em qualquer lugar do mundo. Parece que ao se falar de escola rural é como
se fosse o primitivo pitoresco. As pessoas vêm nos visitar achando que somos um
zoológico”.
O desconforto dos educadores é ainda mais forte quando se fala do caipira. A
palavra já incorporou um sentido pejorativo, da pessoa sonsa e lenta, tal como foi
retratada por Monteiro Lobato no personagem Jeca Tatu.
Na análise de Antonio Candido (1), a palavra caipira é definida como um modo de
ser, um tipo próprio de vida, uma cultura. Não se trata de uma etnia ou raça
específica. O caipira traz na sua cultura a influência semi-nômade, rústica,
aventureira e desbravadora dos bandeirantes portugueses e dos primitivos
habitantes da terra.
Por sua vez, a psicóloga junguiana Isabel Labriola (2) aponta que o caipira
incorpora a persona rústica que responde a um arquétipo do ánthropos, o homem
natural. Para ela, os estímulos da natureza são altamente significativos para a
compreensão e manutenção da vida, gerando uma cultura de troca com a própria
natureza e seus mistérios. O homem urbano, por ter uma cultura técnica e industrial
pretensamente mais evoluída, sente-se superior, caricaturando o caipira como
atrasado e colocando-o em espetáculos pitorescos de inferioridade.
No sentido contrário, a população rural estabelece com a urbana a mesma
relação que os países subdesenvolvidos têm com os desenvolvidos:“Desde o nosso
mito de origem e colonização, ficamos submetidos a uma condição de inferioridade
que continua sendo atuada e mantida historicamente, para garantir diferenças
econômicas, sociais e políticas. Somos, aos olhos e ações do primeiro mundo, os
‘subdesenvolvidos’, os ‘ignorantes’ ou ‘incultos’, os ‘improdutivos’, os ‘coitados’, os
‘atrasados’, uns ‘caipiras pitorescos’. Somos os pobres, os depositários da função
inferior da América... Acontece que acolhemos em nós esta desigualdade” (3). Um
estereótipo do qual é difícil de se desfazer.

(1) Antonio Candido, Os parceiros do Rio Bonito. São Paulo, Livraria Duas Cidades,1987.

(2) Isabel Labriola,“Do Analista-Caipira ao Caipira Analista” in XIII Moitará, República do Pica Pau Amarelo – Arquétipos da Cultura Caipira,

Campos do Jordão, SBPA, 1999.

(3) Isabel Labriola, op. cit.

Comunidades

A escola atende comunidades variadas, que apresentam traços em comum,
mas também características próprias. Algumas, por exemplo, são verdadeiras vilas
ou colônias, formadas por moradias próximas. Dessa forma, as crianças se
encontram constantemente e brincam juntas, prolongando o relacionamento
existente na escola. Em outras, as casas ficam isoladas, e as crianças sentem-se
ainda mais atraídas pela escola, por ser o único espaço de relação e convívio com
meninos e meninas da mesma idade. Há ainda comunidades que parecem vilas
urbanas, com lotes de moradia sem terreno para plantar.
Essa diversidade de bairros confirma a descrição feita por Antonio Candido nos
seus estudos sobre a comunidade rural, quando afirma:“O bairro é uma estrutura
fundamental da sociabilidade caipira, consistindo no agrupamento de algumas ou
muitas famílias mais ou menos vinculadas pelo sentimento de localidade, pela
convivência, pelas práticas de auxílio mútuo e pelas atividades lúdico/religiosas. As
habitações podem estar próximas umas das outras sugerindo por vezes um
povoado ralo; há bairros de unidade frouxa, centrífugos, com um mínimo de
interações. Outros têm a vida social e cultural mais rica, favorecendo a convergência
e as atividades comuns num ritmo que permite chamá-los de centrípetos”4.
De modo geral, as comunidades são marcadas pela mobilidade familiar
causada pelas mudanças de emprego. Outra característica comum são as rápidas
transformações culturais provocadas pela interação – muitas vezes imposta – com a
vida urbana.
Ir para a cidade é um sonho constante nessas comunidades. A cidade surge
como sinônimo de vida melhor, de lugar mais desenvolvido e confortável. Parece
haver a ilusão de que estar na cidade será suficiente para progredir e poder
consumir os produtos desejados.


“A realidade das famílias difere de acordo com a cultura de cada comunidade. As do Bairro

do Papagaio, por exemplo, são normalmente assalariadas e têm três, quatro ou mais filhos.

Gostam muito de futebol, festa e baile. A religião ocupa também um lugar de destaque na vida

familiar. Esta comunidade não parece demonstrar muita preocupação com o futuro, mas de

qualquer forma valoriza muito a escola.” (Altaíde Xavier Junqueira, diretor da Escola Estadual Fundamar.)


Famílias

Tanto nos desenhos das crianças como nas falas dos educadores, as famílias
aparecem como sendo numerosas. E quanto mais pobre é o colono,maior o
número de filhos. Para muitos, a crença de que um maior número de filhos
significará mais mão-de-obra para o trabalho continua valendo.Mas alguns
educadores já percebem uma alteração no perfil familiar, identificando o número
máximo de três ou quatro filhos, e uma média de dois. Segundo a explicação das
crianças no Caderno de Estudos Sociais de 2002,“isto acontece porque família
grande dá muitos gastos”.
O homem é a figura central no sustento das famílias. Ele detém a força de
provedor, que consegue o trabalho e moradia nas fazendas. Já a mãe é vista como
o centro da vida familiar, ocupando-se dos trabalhos caseiros e de algumas
atividades na roça. É ela quem cuida dos filhos, dos parentes idosos e dos doentes.
Esta é uma forte diferença em relação à família pobre urbana, cujas mulheres,mães
e avós são cada vez mais o arrimo não só das relações,mas também do trabalho e
da sobrevivência dos filhos.
Embora os pais não tenham uma relação próxima com as crianças, eles têm se
mostrado assíduos e interessados nas reuniões da escola. O que pode significar a
percepção deste espaço de formação como perspectiva de futuro.
Uma questão enfrentada constantemente pela equipe é o alcoolismo, assunto
presente nas descrições e reflexões feitas pelas crianças sobre as famílias. A
separação dos pais é outra situação comum. Cerca de 20% dos alunos das 2a, 3a e
4a séries em 2002 não viviam com os dois pais, mas com um deles e sua nova
parceira ou parceiro. Segundo os educadores, essa mobilidade, antes urbana, já
parece ser vista com naturalidade, principalmente depois que a família volta a se
estabilizar.
Quando os pais morrem ou não conseguem assumir a criação dos filhos, a
criança é sempre acolhida por um dos avós, tios ou parentes mais próximos. Além
da família estendida, as relações de compadrio aumentam o cerco de proteção,
prevenindo o abandono da criança. Essa é outra diferença significativa em relação à
família urbana de poucos recursos. Ao contar menos com as relações de parentesco
e apadrinhamento, as crianças pobres das cidades estão sujeitas a um maior risco
de abandono.


“A preocupação central da família é a alimentação. Dentro de casa, a parabólica e a TV já

estão presentes. Na parede, o quadro da Última Ceia divide espaço com o retrato de Sandy e

Júnior – um pé na religiosidade e outro nos mitos da infância da Rede Globo. O cachorro divide

o espaço com a criança. O sonho de consumo é ir para Aparecida do Norte. E a mala está

sempre pronta, de repente podem ter que se mudar.” (Maria Lúcia Costa Prado, supervisora das oficinas)


Trabalho

As famílias vivem como colonos assalariados, pequenos proprietários ou uma
combinação dos dois.Mas qualquer que seja o vínculo, com a terra ou com os
patrões, são igualmente pobres.
As mulheres pouco participam do trabalho remunerado, especialmente em
razão da mecanização da lavoura e da crise cafeeira. Em algumas comunidades
elas conseguiram se organizar e criar uma alternativa de renda. No Bairro do
Ouvidor, um reduto de pequenos proprietários, elas produzem doces e artesanato
para vender.
Quanto ao trabalho das crianças, observam-se duas posturas diferentes. De um
lado, acredita-se que os filhos possam ajudar no trabalho para diminuir a pobreza da
família. De outro, a infância é percebida como uma fase da vida em que a criança
deve receber mais do que ajudar. Nesse sentido, o atendimento integral oferecido
pela Fundamar revela-se como um fator decisivo para prevenção do trabalho
infantil, pois garante diretamente às crianças o direito de brincar e estudar, além de
permitir que as mães busquem renda e trabalho próprios, sem precisar impor aos
filhos mais velhos o cuidado da casa e dos irmãos.
De qualquer forma, a busca de trabalho é um desafio constante. Às vezes, a
produção cai, faltam empregos, e as famílias precisam se mudar em busca de novas
oportunidades. A intensa mobilidade traz consequências diretas na forma de viver
da família e no processo de desenvolvimento e aprendizagem das crianças.

Alimentação

A alimentação é vista como primeira necessidade e é muito valorizada pela
família. Segundo Antonio Candido, em seus estudos sobre a sociedade caipira, o
alimento tem valor simbólico e uma forte importância social. Relembrando ou
refletindo a situação de crise e escassez dos alimentos prediletos, cria-se uma
“fome psíquica”, que confere um valor especial à alimentação, influenciando a
personalidade, a visão de mundo e os hábitos sociais.
Entre as famílias, embora não haja abundância, também não há fome, e as
refeições se constituem em um momento de partilha. Como conta a coordenadora,
Maria Lúcia Prado Costa,“é raro visitar uma casa de pais em que não seja oferecido
algo para comer, mesmo que seja laranja do pé”. Nas mesas, cada vez estão mais
presentes produtos industrializados, como macarrão, biscoito e massa de tomate.
Dificilmente encontra-se milho, mandioca, porco ou galinha no terreiro. Maria Lúcia
explica que as famílias que vivem como colonos assalariados não têm plantação
em casa por restrição do patrão ou por estarem apenas de passagem. De qualquer
forma, apesar da mudança nas rotinas, os horários de refeição continuam sagrados.
As crianças, logo quando descem do ônibus, correm para ler o cardápio do dia
no quadro negro do refeitório, o que é um ótimo incentivo à leitura. Na reunião de
pais é organizada uma feirinha de alimentos, onde doces, pastéis e coxinhas são
vendidos e comprados com alegria.

Religiosidade

A religiosidade é parte forte da cultura local. Prevalece a tradição católica, com
a celebração de missas, rezas do terço, grupos de oração, procissões e romarias.
Há uma especial devoção à Nossa Senhora Aparecida. A imagem da santa, indo de
casa em casa, acompanhada de cantos e orações, é uma tradição antiga que se
mantém acesa.
Na Fundamar, não só os pais mas também os educadores são pessoas
religiosas. Muitos participaram ou participam de movimentos sociais católicos e até
mesmo os lideram. Segundo os educadores, as crianças desde pequenas rezam
com muito fervor e, quando têm alguma intenção especial, pedem aos pais para
fazerem orações em grupo.

Lazer e diversão

São poucas as opções de lazer para os adultos. O futebol é um dos raros
motivos de encontro e diversão na comunidade.Todo domingo, os homens
costumam se reunir para jogar bola, acompanhados das mulheres e crianças, que
se entusiasmam na torcida.
Para os homens, outro ponto de encontro habitual é o boteco. É ali onde se
reúnem para contar seus “causos”, trocar informações, fazer negócios e... tomar
cachaça. Desde a época dos engenhos de cana-de-açúcar, o álcool fabricado nas
fazendas tem presença forte nas comunidades rurais. De geração em geração, é
seguida a máxima:“Homem que é homem bebe”. Os casos de alcoolismo são
constantes. (Leia texto escrito pelos alunos da Fundamar sobre esse assunto na
pág. 40.)
As mulheres, por sua vez, pouco se divertem. No seu dia-a-dia, não há separação
entre horário de trabalho e de descanso ou lazer. Nos fins de semana, a
família raramente vai à cidade, a não ser nas celebrações, em geral religiosas.
Dificilmente tiram férias ou viajam.

A infância longe das cidades

Segundo os educadores, a infância no campo é “como outra qualquer”. De
qualquer forma, ser criança no campo parece ter algumas vantagens em relação à
infância nas cidades. A principal delas talvez seja não viverem fechadas, tendo mais
espaço e liberdade para encontros e brincadeiras.
O cotidiano das crianças varia de comunidade para comunidade.“Em algumas,
elas criam seus próprios brinquedos, como na época de seus pais. Fazem bonecas
de sabugo de milho, brincam de roda pião, pique, pipa, cantigas de roda... Em
outras, apesar de terem espaço, parecem viver como as crianças dos centros
urbanos. Ficam muito tempo dentro de casa, diante da televisão”, observam os
professores.
Na visão dos educadores, as crianças se expressam muito bem no desenho,
representando a realidade que vivem com riquezas de detalhes.Mas têm
dificuldades na expressão oral. Têm dificuldades de dar informações sobre si, em
falar seu nome, nome do pai e da mãe, seu endereço. Dizem:“Eu moro na roça, na
roça do ‘homi’”. A relação com o tempo também é diferente. Dificilmente as
crianças usam relógio ou consultam o calendário, por mais que estes estejam
pendurados nas paredes de suas casas.
Todos esses itens são investigados pela escola, sendo contemplados no projeto
pedagógico. No dia-a-dia não faltam estímulos para cada um falar de si, descrever,
interpretar, construir a noção de tempo e espaço.

Ritmo de vida

“O povo rural”, descrevem os educadores,“é um povo sem sobressaltos ou
medos. Apesar da vida dura, são curiosos e gentis. Existe tempo para prestar
atenção aos outros. As pessoas daqui são mais cordiais e cooperativas.”
Tradicionalmente, o ritmo do campo é marcado pela natureza: hora de plantar,
hora de esperar, hora de crescer, hora de colher. Nas últimas décadas, um novo
ritmo de produção foi trazido com a expansão dos adubos, fertilizantes, tratores e
colheitadeiras.
As crianças rurais mostram uma maior serenidade, inclusive corporal e motora.
Um pequeno exemplo é seu comportamento dentro do ônibus na ida e na volta da
escola. Elas permanecem sentadas, tranquilas,muitas vezes olhando a paisagem
pela janela.Também é significativa a relação com os animais – presentes na
maioria das casas. Esse vínculo torna-se um grande catalisador do afeto,
desenvolvendo nas crianças uma postura protetora, que combina responsabilidade
e ternura.


“As familias não vivem isoladas do mundo. São famílias rurais, mas têm contato com a

cidade. Os objetos de consumo urbano, como carro, parabólica, TV, som, celular, já fazem parte

do dia-a-dia de várias crianças.” (Cibele Ercília Pinto Costa, supervisora da Educação infantil)


Conflitos e mudanças

Ao mesmo tempo que os educadores ressaltam um jeito de ser próprio das
famílias rurais, não negam que há um intenso contato e conflito com o mundo
urbano. Seja no trabalho ou no lazer, a chegada das novas tecnologias tem forte
impacto na vida das crianças e dos adultos. Na roça, por exemplo, a mecanização
do trabalho faz com que não haja mais espaço para o saber sobre a plantação, a
chuva, a colheita. Os remédios e alimentos caseiros também cedem lugar aos
produtos trazidos das cidades.
O início da noite, um tradicional momento de encontro para os comentários
sobre o dia, a “contação de causos”, é hoje vivido em frente ao aparelho de
televisão, visto como algo negativo pelos educadores. Algumas avaliações colhidas
entre eles confirmam isto:“A televisão incentiva a passividade”,“A criança fica com
preguiça de criar”. Ou ainda:“É verdade que a TV traz informações. Mas geralmente
os pais não percebem a hora de desligar e não avaliam quais são os programas
prejudiciais. Para eles, qualquer programa está bom.”
Um pequeno detalhe, como os nomes das crianças, demonstra a complexidade
dessa influência. Herdeiras da cultura religiosa portuguesa, as famílias costumavam
batizar seus filhos de Antônio, José ou Maria. Nos últimos anos, entretanto,
aumentou a variedade de nomes – muitos deles estrangeiros – inspirados em
filmes, novelas, jogadores de futebol, e divulgados pela televisão. Mas o mais
interessante é notar que surgiram nomes como Kelly Aparecida ou Wesley Antônio,
fruto da interação entre o novo e o tradicional.
“As crianças e jovens estão com um pé no rural e outro no urbano e têm que se
equilibrar”, diz a coordenadora Maria Lúcia Costa Prado, resumindo o desafio vivido
pela escola.“A escola tem tentado trazer estes dilemas – cidade x roça, homem x
natureza, rapadura x biscoito – para dentro da sala de aula para que sejam mais
bem discutidos e compreendidos”, afirma. A Fundamar assume, portanto, o papel
de estimular a discussão e entendimento dos conflitos para que a população que
vive no campo escolha melhor seus próprios caminhos.





A PROPOSTA PEDAGÓGICA

1. Etapas de uma proposta pedagógica

Dedicada a refletir e sistematizar o trabalho desenvolvido pela Escola Estadual
Fundamar (5), a supervisora Maria Lúcia Prado Costa identifica quatro fases principais
na sua trajetória pedagógica:

1984 e 1985 - Desenvolvimento comunitário

A escola começou com um forte papel comunitário, que norteou seus dois
primeiros anos de atuação. Além das crianças, pretendia-se atingir também as
famílias de trabalhadores rurais. Havia como propósito a fixação do homem no
campo, o desenvolvimento da agricultura orgânica e a geração alternativa de renda.
Por um lado, foram criados diferentes espaços para convivência e integração
dos adultos, como o clube de mães, o time de futebol e um conjunto musical. Ao
mesmo tempo, aconteciam atividades de orientação de plantio, higiene, educação
para o lar, direitos trabalhistas, história de vida, entre outras.
Havia a expectativa de que, com o tempo, a própria comunidade se
organizasse, criasse um conselho comunitário e gerisse o projeto. Mas foi tudo mais
difícil do que se imaginava e, aos poucos, a escola começou a redirecionar seu foco
de atuação.“Olhando para trás, percebemos que, na falta de uma proposta
pedagógica própria, a escola incorporou a ideologia presente na época, tomando
para si o encargo de superar os entraves para a resolução dos problemas dos
trabalhadores rurais”, avalia Maria Lúcia.

1986 a 1989 - Supervisão não formal

Em 1986, a escola começa a buscar seu próprio quadro de supervisores – tanto
administrativos como pedagógicos. Logo surge uma grande dificuldade, que
permanece até hoje: encontrar profissionais especializados, dispostos a morar em
um lugar tão distante e isolado.
Para suprir a ausência de supervisão, a escola investe intensamente em cursos
pontuais de formação e qualificação com especialistas em Educação e Artes. Os
dois desafios principais deste período foram os de aprimorar a qualidade do
trabalho e integrar as atividades da escola formal às oficinas.

1990 a 1992 - Proposta pedagógica

O projeto de desenvolvimento comunitário dá lugar a uma proposta pedagógica
centrada na criança. Entende-se que a comunidade não será atingida diretamente
pela escola, mas por seus alunos. Ao voltar para suas casas, cada um poderá
promover o projeto de organização comunitária, incluindo discussões sobre saúde,
saneamento, cultura, lazer,memória e direitos sociais.
Nessa mesma época, firma-se o primeiro convênio entre a Escola Estadual
Fundamar e a Secretaria de Educação de Minas Gerais, dando formato jurídico à
cooperação já existente. No esforço de enriquecer sua pedagogia, a escola introduz
os módulos temáticos: índios do Sul de Minas ou a história da cidade de Paraguaçu,
por exemplo; buscando elaborar conceitos de forma mais significativa e desenvolver
a reflexão e o pensamento crítico.

1993 até hoje - Convivência de pedagogias

Em 1993 surgem os Cadernos de Estudos Sociais com patrocínio inicial da
Fundação Vitae – Apoio à Cultura, Educação e Promoção Social e da Secretaria da
Educação de Minas Gerais. Posteriormente, a iniciativa é apoiada pelo Programa
Crer Para Ver, da Fundação Abrinq e da empresa de cosméticos Natura. Os Cadernos
definem uma linha pedagógica que era procurada pela escola desde seu início:
transformar a realidade do aluno em objeto de constante investigação.
O atendimento é ampliado até a 8a série. A escola passa a ter uma supervisora
para cada área: Educação Infantil, primeiro e segundo ciclos do Ensino Fundamental
e oficinas.Mas a intensa rotatividade dos supervisores, somada às mudanças nos
fundamentos e estruturas oficiais do Ensino Fundamental, dificulta a solidificação de
uma pedagogia.
Entretanto, a supervisão das oficinas e dos Cadernos de Estudos Sociais, a
cargo da própria Maria Lúcia, mantém-se constante e torna-se o fio condutor da
proposta de aprendizagem. Diferentes correntes e interlocuções pedagógicas se
fazem presentes, com destaque para a proposta de pesquisa participante de Carlos
Rodrigues Brandão6, que orienta a metodologia investigativa e a produção de
conhecimentos desenvolvidas pela escola; os estudos de Antonio Candido (7),
adotados como referencial para o entendimento das comunidades rurais; e as
reflexões de Milton Santos (8) sobre a construção do espaço geográfico e da
cidadania.

2. Bases conceituais que fundamentam a proposta

Somando e recriando os diferentes conceitos, a Escola Estadual Fundamar constrói
uma compreensão própria de aprendizagem, baseada nos seguintes alicerces:
_ Os conteúdos trabalhados partem da cultura e dos saberes dos alunos
e suas famílias. Os alunos participam de um movimento de investigação
sobre si próprios e seu contexto espacial e familiar.
_A realidade é problematizada, e os alunos usam de sua criatividade
para buscar soluções, uma vez que não são apresentados modelos prontos.
_Todos são aprendizes. Embora com níveis de saberes diferentes, alunos
e professores se sentem autores da construção do seu conhecimento,
apoiados entre si e pela supervisão.
_ A escola deve ser prazerosa, porque aprender deve ser interessante,
uma fonte de alegria, não de pressão ou castigo.
_ O processo de pensamento do aluno deve ser objeto de estudo
coletivo dos professores.

(6) Carlos Rodrigues Brandão, Pesquisa participativa. São Paulo, Brasiliense, 1990.

(7) Antonio Candido, Os parceiros do Rio Bonito. São Paulo, Livraria Duas Cidades, 1987.

(8) Milton Santos, O espaço do cidadão. São Paulo, Studio Nobel, 2002.



O SER HUMANO QUE QUEREMOS FORMAR

1 Um ser humano consciente e crítico.
2 Que tenha condições de se comunicar, se relacionar, tomar posições,
enfrentar os desafios da sociedade na busca de seus objetivos.
3 Que tenha autonomia de pensamentos e ações.
4 Que seja consciente da sua realidade, de seu mundo.
5 Que consiga fazer escolhas e assumi-las, com as perdas e ganhos que
isso requer.
6 Que seja sujeito do seu desenvolvimento e da sua aprendizagem.
7 Que saiba buscar os caminhos para se desenvolver.
8 Que tenha sonhos, esperanças e sentimentos de alegria pela vida.
9 Que tenha dignidade.
10 Que saiba viver em igualdade, respeitando as diversidades culturais.
11 Que saiba enfrentar o mundo lá fora.
12 Que ocupe seu espaço e que valorize sua profissão, aquilo que faz.
13 Que tenha clareza dos seus direitos e seja cumpridor de seus deveres.
14 Que valorize os princípios éticos, morais, religiosos e sociais.
15 Que se preocupe em gerar a vida e não em criar bombas.
Resultado de oficina de reflexão da equipe de coordenação
durante o processo de sistematização.


3. A metodologia investigativa

Um dos pilares da proposta pedagógica da Escola Estadual Fundamar é uma
metodologia investigativa, que leva a escola a pesquisar, observar e analisar
constantemente a criança e seu contexto. Esta investigação é feita em diferentes
planos pelos supervisores, professores e pelas próprias crianças que, de forma
sistemática e organizada, se propõem questões a serem pesquisadas e respondidas:
“Quem somos nós?”“O que é ser ‘do campo’?”“Qual é nossa história?”“Como é
nossa escola?”“Como são nossas casas?”“Como é nossa família?”“Como é nossa
cidade?”“Por que mudamos tanto de moradia?”“Quais são as nossas dificuldades?”
“Por que temos estas dificuldades?”“O que queremos para o nosso futuro?”
A realidade da criança torna-se ponto de partida para o processo de leitura do
mundo. Considerada como sujeito intelectivo e detentor de cultura própria, a criança
é estimulada a se tornar agente participante na construção de sua autonomia como
cidadã.“Nosso objetivo é conseguir que elas tenham autonomia de pensamento e
de ação. Se conseguirem fazer e assumir suas escolhas, com as perdas e ganhos
que elas trazem, acho que está de bom tamanho”, sintetizou Maria Lúcia durante a
discussão dos objetivos pedagógicos da escola.
A postura investigativa provocada nas crianças também está presente nos
professores.Todos, em qualquer idade, devem buscar novos conhecimentos. Neste
momento, com a exigência oficial de diploma superior para exercer o magistério,
praticamente todos os professores da Fundamar de Ensino Fundamental já são há
muito tempo graduados. Os atuais monitores artesãos de oficinas estão
frequentando as faculdades das cidades vizinhas, provocando um crescimento no
grupo. Segundo Maria Lúcia,“é bom os alunos verem que os professores também
estudam e pesquisam”.
Dessa forma, as crianças observam que sempre existem perguntas a serem
respondidas, que o saber precisa ser continuamente garimpado e que ele permite
às pessoas se conhecerem melhor, bem como a sua realidade. O objetivo é sempre
o mesmo: fazer escolhas conscientes e conquistar uma vida melhor, para si e toda a
comunidade.
Nesse processo, crianças, professores e educadores produzem textos e montam
seus próprios livros, aprofundando reflexões, ao mesmo tempo que investigam a
forma como se dá o conhecimento intelectivo das crianças, como constroem suas
capacidades operativas e noções de tempo e espaço. Usando os referenciais
conceituais construtivistas de Piaget e Vigotsky, os professores exercitam a
fundamental capacidade de ouvir, observar e registrar, passando a compreender
como as crianças desenvolvem o pensamento e como se constituem como sujeitos.


“Trazer para o cotidiano das crianças (e dos professores) a percepção dos problemas do

seu meio, desenvolvendo com elas o exercício de pensar sobre as situações vividas, para melhor

compreendê-las e explicá-las, e se for o caso propor soluções plausíveis, é a função da

escola.” (Caderno de Estudos Sociais de 2002, livro didático elaborado pelos alunos e educadores da Escola Fundamar)


Descobrindo o espaço da escola


Texto da professora Sueli Pereira elaborado a partir do relato das crianças e

publicado no Caderno de Estudos Sociais de 1998


“Com a ajuda de João Ernesto (monitor responsável pela horticultura), fizemos o trajeto de uns 2 km, mais ou

menos, para conhecer a área de plantio e os açudes com suas utilidades. Descemos e à nossa direita deparamos com

o plantio de batata-doce; do lado direito deste plantio, a horta, onde se planta de tudo (verduras e legumes).

Descemos mais uns 50 metros e em frente ao açude do Flavinho, segundo João Ernesto, o nome foi dado em

homenagem ao construtor deste açude. A água que abastece o açude vem de uma restinga do mato. Se utiliza

desta água para aguar o jardim da casa da D. Creusa e o viveiro do café.

Viramos à esquerda e andamos mais uns 200 metros e à nossa direita nos deparamos com o açude do Meio.

Segundo João, a água que abastece este açude vem da mina de Maçaranduba, e que tem este nome devido a uma

árvore nascida neste lugar. Essa mina é muito rica em água. À nossa esquerda chamou-nos atenção o pomar com

laranjeiras, limoeiros e mexeriqueiras.

Continuamos a andar e mais uns 150 metros, chegamos em frente ao açude Branco, que segundo João é o mais

velho, construído em 1802, a couro de boi. O abastecimento deste se faz com a sobra do açude do Meio e com a sobra

da água na mina das Abelhas. Utiliza-se dessa água para a irrigação das grandes plantações (feijão, batata e milho).

Continuamos a andar e chegamos onde se capta a água da mina das Abelhas. Esse foi o ponto final da nossa

pesquisa. O caminho dessa captação até a escola tem 1,5 km mais ou menos. O percurso durou uma hora.

A excursão foi muita proveitosa, de maneira prazerosa as crianças conheceram parte da história da nossa escola.

Durante este passeio, ficaram bastante curiosas. Perguntaram o que estavam plantando, fizeram perguntas

sobre distância de um açude para o outro. João Ernesto falou em quilômetros, Ludiélisson comentou que em 1 km há

mil metros. João falava o porquê da cor escura do Meio devido ao lodo no fundo do açude. Eles discordaram, dizendo

que a água é escura, devido a muita sombra do mato que tem ao redor. Queriam conhecer as minas; a que vem da

restinga da Maçaranduba e principalmente das Abelhas. Não ficaram satisfeitos só com a localização de cada açude.

Queriam conhecer o açude Preto, que segundo João Ernesto, antigamente abastecia o açude Branco. Hoje o açude

Preto desagua no ribeirão Ouvidor, que por sua vez desagua no rio Sapucaí, em Guaipava.”



4. O tesouro da memória

A pedagogia desenvolvida pela Escola Estadual Fundamar reconhece a
memória como ferramenta fundamental para a construção de conhecimentos e
saberes. Por meio da pesquisa participante9, professores e crianças fazem a
reconstituição das histórias pessoais e coletivas. Ao resgatar a cultura do campo,
suas raízes e significados, buscam enfrentar a perda de identidade e de sentido de
pertencimento aceleradamente vivida pela população local.
Estudos atuais de neurociência revelam a importância da memória nos
processos de aprendizagem. É considerada a base de todo o saber. Afinal, é a
memória que dá significado ao cotidiano, permite lembrar e acumular experiências,
manter a identidade, formar e aprofundar vínculos. E mais: é ela que garante a
apropriação de si, mantendo a integridade do indivíduo, a identidade de um povo e
de uma cultura.
As crianças e professores refazem a história de suas vidas, de suas famílias, sua
escola, cidade e país. A memória, portanto, não é entendida como mero registro,
cópia da realidade ou como acúmulo de informações. Não é usada só para lembrar
ou reviver, mas principalmente para refazer. Assume um papel ativo, gerando
sentimentos e emoções, construindo hipóteses, ampliando e aprofundando ideias,
analisando,modificando, criando e desejando.
Ela faz aparecer o que estava desaparecendo, promove continuidade quando há
rupturas, favorece a unidade quando há processos desintegradores, explica quando
há perguntas e, como resultado, dá possibilidades para que cada sujeito ou grupo
busque seu lugar, seu valor singular, sua originalidade. Nesta diferença, está
pautada a igualdade de todos terem direito a serem únicos, como indivíduos ou
grupos.
A memória promove, assim, a reflexão do agora a partir do antes. Constrói
conhecimentos e significados, para buscar o lugar de cada um, de cada grupo e dar
lugar para todos.
Segundo o geógrafo Milton Santos,“existe uma íntima relação entre a alienação
moderna e a construção do espaço do sujeito. Quando o homem se confronta com
um espaço que não ajudou a criar, cuja história desconhece e cuja memória lhe é
estranha, este lugar é fonte de uma vigorosa alienação, uma vez que o entorno
vivido é um lugar de interações e trocas,matriz de um processo intelectual”10.
Mas se o espaço aliena, ele é também condição de desalienação. O debate
sobre cidadania está intrinsecamente vinculado ao debate sobre produção de
espaço como reconstrução da sociedade. Assim, a escola é um espaço privilegiado
de interações e trocas e de construção de pertencimento.

(9) Carlos Rodrigues Brandão, Pesquisa participativa. São Paulo, Brasiliense, 1990.

(10) Milton Santos, op. cit.

5. Construindo a memória local

Para dar instrumentos pedagógicos adequados aos alunos e professores e
construir referências sobre a história e a geografia (o tempo e o espaço) do seu
entorno, os educadores da escola saíram a campo identificando depoentes,
reproduzindo fotografias, unindo fontes escritas que se encontravam dispersas,
criando textos,mapas e desenhos. O objetivo é articular todas essas informações
para criar um banco de dados sobre o tempo e o espaço comunitários.
No início, seis eixos temáticos orientaram a produção: ocupação e estrutura
fundiária; gado; café; pequena produção; educação e saúde; religião e lazer.


Conhecendo nosso estado de Minas Gerais

Texto coletivo feito pelas crianças e professora de Educação

Fundamental, publicado no Caderno de Estudos Sociais de 2002

Nós sabemos que a origem do nosso estado vem das minas de ouro que
foram descobertas pelos bandeirantes. O ouro de Minas foi desaparecendo e
as pessoas resolveram ir para o campo chamado de Gerais porque eles
estavam sem ouro, passando dificuldades e fome.
Para sobreviverem começaram a trabalhar com a agricultura e pecuária,
(criação de gado).
Nosso estado é chamado de Minas Gerais e seu formato parece com o
rosto de uma bruxa nariguda...



A baixa escolaridade dos moradores mais antigos da região e o número
reduzido de fontes escritas e fotográficas organizadas definiram a história oral como
sendo a estratégia fundamental para coleta das informações. Elegeu-se como tema
A história social do Sul de Minas, em busca da gênese da classe trabalhadora rural
nas antigas regiões da Freguesia do Carmo Escaramuça (atual Paraguaçu) e Santo
Antônio do Machado (atual Machado) a partir da segunda metade do século XIX.
Afinal, como filhos de trabalhadores rurais, essa história dizia respeito às crianças.
Entre outras fontes, foram entrevistados um filho de escravos, que contou
histórias narradas pelo pai, bem como descendentes de imigrantes italianos.
Também foram consultadas antigas hospedarias, arquivos públicos, bibliotecas
municipais, entre outros. Essa pesquisa gerou o livro Fontes para a História do Sul de
Minas: os trabalhadores de Paraguaçu e Machado (1850-1900), de Maria Lúcia
Prado Costa, a coordenadora das oficinas da Fundamar, que é historiadora de
formação. Publicado em 2002 com apoio do programa Crer Para Ver, da Natura e da
Fundação Abrinq, com tiragem de 500 exemplares, a obra foi distribuída
gratuitamente às escolas de Ensino Fundamental e às Secretarias de Educação de
38 cidades da região de Varginha.
Na sequência, novos temas foram explorados: a história da Associação de
Crédito à Assistência Rural (ACAR), a história das escolas rurais da região, as
práticas de saúde da população, a história das parteiras e benzedeiras tradicionais,
entre outros.
Esse rico acervo serviu de matéria-prima para alunos e professores produzirem
material didático para as primeiras séries do Ensino Fundamental.Textos
informativos e ficcionais narrando o ciclo dos principais produtos da lavoura e da
pecuária local foram criados pelos alunos da Fundamar, que também imaginaram
jogos de trilha sobre a natureza da região. As crianças fizeram cartazes ilustrativos
das fases históricas da cultura do café, principal cultivo da região, produziram um
croqui da escola, das fazendas e bairros atendidos, além de mapas e plantas
urbanas dos municípios de Paraguaçu e Machado.
A mão-de-obra que impulsionou o ciclo cafeeiro no sul de Minas Gerais (acima, retrato da família Fressato, de imigrantes italianos) foi analisada pela historiadora Maria Lúcia Prado Costa e editada pela Fundação 18 de Março como um dos Cadernos de Estudos Sociais da Fazenda Escola Fundamar.

Histórias de nossas vidas

Os alunos da Escola Estadual Fundamar são constantemente instigados a
investigar seu tempo e espaço a fim de terem mais consciência e de serem capazes
de perceber e atuar sobre sua realidade. Um exemplo dessa prática é a construção
de textos coletivos sobre as Histórias de nossas vidas.
Às vezes, após a produção coletiva do texto, as turmas são divididas em
pequenos grupos para que cada um crie uma situação sobre o tema trabalhado.
Numa atividade sobre conflitos familiares, por exemplo, foram montadas cenas
criativas especialmente sobre o uso de bebidas pelos pais, gerando identificação e
debate nas turmas. A reconstrução e discussão dos conflitos e elaboração sobre
possíveis soluções e mudanças dão às crianças consciência das dificuldades e
melhores condições de se posicionar.


A história de nossas vidas

Texto produzido pelos alunos, publicado no

Caderno de Estudos Sociais de 2002

Pesquisamos com nossos pais algumas coisas sobre nossa vida. A
maioria dos nossos colegas mora na roça (22 criancas na zona rural) e o
restante mora na cidade. (quatro crianças na zona urbana). Tanto na roça
como na cidade sabemos que existem problemas. Depois de discutirmos com
nossos colegas e professora, achamos que na roça ainda é mais calmo e
mais tranqüilo para se viver. Outro motivo é porque nascemos na roça e
preferimos continuar morando aqui.
Mudamos algumas vezes e os motivos foram:
* fomos mandados embora, trocou o patrão;
* não estávamos contentes com o salário;
* ganhamos ou compramos casa na cidade;
* morte de alguém da família ou separação dos pais;
* mudamos da roça para a cidade ou o contrário.
O nosso colega Loran mudou da rua da Máquina em Machado para a
fazenda do Sr. Edvan, no bairro Pica-pau, onde tem vários parentes. O
pai de Loran não trabalha para o Sr. Edvan, mas mora na fazenda dele.
A Bruna morava no litoral de S.Paulo em Ubatuba. O pai dela cuidava
de chalés. Neste ano eles se mudaram para o bairro do Ouvidor, onde o
pai comprou umas terras, mas ele trabalha para o Italiano.
Moramos em várias cidades como: Machado: Douradinho, distrito de
Machado; Carvalhópolis; Carmo do Rio Claro; Alfenas; Belo Horizonte;
Viçosa, cidades de Minas Gerais. E também em Ubatuba, no estado de
S.Paulo. Outros nunca mudaram, nasceram e continuam morando no mesmo
lugar, mas são poucos os que moram em casa própria, a maioria mora em
casa dos patrões.


Em nossa família aparece de tudo, cada um com seu jeito

Texto coletivo produzido pelos alunos,

publicado no Caderno de Estudos Sociais de 1998

Alguns pais ajudam em casa fazendo comida, lavando roupa, trocando os filhos, e
alguma coisa mais.
Outros não gostam de ajudar. Alguns não levam jeito e estão cansados do serviço.
Percebemos que há muita briga em nossos lares, pois é a danada da pinga que
atrapalha e destrói algumas famílias. Em alguns casos a mulher sente vergonha de
sua bebedeira e do que ela faz. Percebemos que muitos pais gostam mais da pinga do
que da própria família.
Gostaríamos que a pinga não existisse, para haver mais união e alegria em nossas
casas.
Lucas sugeriu que fizéssemos alguns cartazes e procurássemos remédios contra a
pinga. Elidison disse que tinha um remédio muito bom: um copo de pinga mais pimenta
malagueta. Essa bebida queima tudo. Heberton disse que é só cozinhar os pés de um
urubu e dar o caldo para eles beberem.
Outras simpatias foram citadas e eles disseram que sabiam porque ouviram falar.
José disse que o tira-álcool é uma cacetada, compra na farmácia; isso ele escutou
no rádio. Põe na comida ou no café sem o doente ficar sabendo. Se ele tornar a beber
vomita até as tripas (sua irmã deu para o marido).
Alguns sugeriram que rezar ajuda e Rodrigo se prontificou em trazer e de fato
trouxe alguns versos de seu pai que são muito bonitos:
Beija-flor de rabo branco
Dê três voltas no cupim
Deus me ajude e me dê inteligência para mim.
Na parede do meu quarto
Eu preguei uma cruz
Pra lembrar Jesus que também foi
Pregado na cruz
Vinte e cinco de dezembro
Quando o galo deu sinal, nasceu menino Jesus
Numa noite de Natal.
Em protesto contra a pinga, Lucas sugeriu que fizessem cartazes para pregar
por todos os lados até mesmo na porta de certas casas. Mas Edson disse: “Tem pai
que não sabe ler e os outros podem até nos agredir. Eles acham que a criança não
sabe nada”.
Heberton concluiu: “E com isso eles não estão percebendo que estão destruindo a
própria família”.


6. A produção de conhecimento

Um marco pedagógico da Escola Estadual Fundamar é a produção permanente
de conhecimento por parte dos educadores e das crianças, que inclui três frentes
complementares:

Cadernos de Estudos Sociais

Em vez do tradicional material didático, pronto e acabado, a Fundamar estimula
que os alunos e professores de cada classe elaborem seus próprios textos, seguindo
o programa definido. Coletivos ou individuais, os textos são reunidos nos chamados
Cadernos de Estudos Sociais, já conhecidos em todo o Sul de Minas. A produção


CADERNO DE ESTUDOS SOCIAIS: UM EXEMPLO

Em 2002 o roteiro proposto aos alunos da 2a série estava dividido em três
grandes temas:
A Família: identificação dos membros da família, suas idades e as relações de
parentesco; construção do conceito de família; interação familiar (debate sobre os
grupos de interação de cada membro: trabalho, escola, grupo religioso, time de
futebol etc.); árvore genealógica; história de vida.
A Casa: construção de conceitos, com análise de diversos tipos de casas,
contrastes entre as da cidade e as do campo etc.; identificação da casa e
elementos adjacentes, como horta, casinha, paiol; elementos de devoção: desenho
dos enfeites da parede da sala de visitas da casa e descrição de seus significados;
representação do espaço interno da casa, em argila e em planta baixa.
A Escola: saneamento (água de beber, de consumo geral, esgoto, fossa, lixo);
proposta de melhoria do padrão de qualidade, como campanhas coletivas ou
alternativas de reciclagem; croquis da escola, observando-se a proporção e a
distância entre os equipamentos; batalha naval (exercício de localização de pontos
do croqui a partir de indicações de referências topológicas); áreas verdes da escola
(áreas de plantio, açudes, vegetação remanescente); história da escola.
desse material busca superar o perceptível distanciamento entre os textos
geralmente utilizados nas salas de aula e a realidade dos alunos. Responde à
preocupação dos educadores de que a escola não se torne um espaço engessado,
estereotipado, de mentirinha ou faz-de-conta, com currículos sem sentido para a
criança atendida.
Esses cadernos são produzidos, ao longo do ano letivo, pelos próprios alunos de
2a, 3a e 4a séries do Ensino Fundamental, de forma a garantir a cada um deles a
flexibilidade de montar, a partir de um roteiro prévio e geral, a sua própria cartilha,
com registro e análise de sua realidade social, que, apesar de coletiva, tem aspectos
peculiares, estritamente individuais. Assim, ao final de cada ano, todo aluno dessas
séries terá concluído o seu próprio Caderno de Estudos Sociais.


Grupo de estudos

As supervisoras realizam grupos de estudos para aprofundamento teórico,
análise dos resultados da aprendizagem dos alunos, do material produzido por eles
e dos relatos das professoras. É tema constante de investigação a forma pela qual
as crianças constroem seu pensamento e a noção de tempo e espaço na realidade
onde vivem.
Um exemplo das preocupações da escola é compreender o impacto da intensa
mobilidade das famílias e dos alunos, mudando-se de uma fazenda para outra, do
campo para a cidade ou vice-versa, na dinâmica das famílias e no processo de
aprendizagem das crianças. São várias as questões que devem ser atendidas na
proposta pedagógica:
_ Em que medida este intenso processo de “desenraizamento” das famílias
do meio rural responde pelas dificuldades de aprendizagem, uma vez que essa
desordenada mudança de lugares se daria concomitantemente à maturação das
funções intelectivas referentes aos raciocínios sobre tempo e espaço?
_ Em que medida as características próprias de percepção e mensuração de
tempo e espaço ditos “rurais” se distinguem dos “urbanos”? Como essas
diferenças incidem sobre os processos de cognição que vivem a mudança de um
lugar “rural” para um lugar “urbano” ou o movimento no sentido inverso?
_ Em que medida as constantes mudanças, o “desenraizamento” e a perda
do pertencimento trazem para a criança dificuldades de se vincular, uma vez que
está vivendo perdas, aprendendo que tudo é descartável, que nada é duradouro e
que nada lhe pertence?



UMA BIBLIOTECA COMO TODA ESCOLA

PÚBLICA DEVERIA TER

A biblioteca da Escola Estadual Fundamar, com cerca de 2.000 títulos e
5.000 volumes,mantém um banco de dados em constante atualização, além
de livros didáticos, literatura infanto-juvenil, mapas, vídeos, gibis e jogos.O
acervo compreende também enciclopédias, como Barsa Multimídia 2000 e
Mirador. Na gibiteca destaca-se a clássica Tico-Tico. Para os professores, há uma
seção sobre pedagogia. Segundo Maria Lúcia Prado Costa, essa é uma
biblioteca interessante,“pois nós encontramos obras de Paulo Coelho a
Shakespeare, Saramago, Florbela Espanca, até exemplares luxuosos, como D.
Quixote de La Mancha, de Miguel de Cervantes com ilustrações de Gustave
Doré”.
O acervo fotográfico da escola, formado a partir de 1984, e da
comunidade também ficam sob responsabilidade da biblioteca, que funciona
como uma oficina. Há uma monitora em horário integral, formada em Letras,
que além de organizar e catalogar o acervo, desenvolve temas bimestrais com
cada turma de 1a a 4a série (D.Quixote, Lampião,Monteiro Lobato, por
exemplo, foram temas em 2003).“Estes temas”, explica Maria Lúcia,“são
desenvolvidos dentro da mesma pedagogia das oficinas: o que as crianças já
sabem, o que poderão saber, desenhos, dramatizações, o que esse tema tem a
ver conosco hoje etc.” São sessões de 50 minutos diariamente com as turmas
da Artes e Ofícios (1a e 2a séries) e uma sessão semanal com as turmas das
demais oficinas (Horta, Cerâmica, Fiação) de 3a e 4a séries.
As séries da Educação Infantil e do segundo ciclo do Ensino Fundamental
têm horários próprios com os professores para pesquisa escolar e para aulas de
Literatura.“As crianças a partir da 1a série podem levar livros para casa,mas
nota-se um declínio no interesse pela leitura a partir da 5a série.Os professores,
infelizmente, leem pouco; já os monitores são obrigados a levar um pacote de
férias a cada recesso escolar”, relata a coordenadora da Escola Fundamar.As
turmas de 1a a 4a série, tanto na sala de aula quanto na oficina,têm um
"Cantinho de Leitura",montado com livros doados pela Secretaria de Educação
de Minas Gerais.Esses Cantinhos são alternados em rodízio, conforme o perfil da
turma.
Além dessas atividades rotineiras, há um acervo circulante, composto por
obras mais populares (puericultura, receitas de culinária, palavras cruzadas,
livros de bolso, textos religiosos), que são oferecidos à comunidade em todos
os eventos da Escola: reuniões de pais, encontros da Pastoral da Criança ou
cursos oferecidos na comunidade.A biblioteca também é responsável pelo
mural de notícias de jornais e notícias produzidas pelo pessoal da escola, e
toda quarta-feira promove uma exposição de livros no refeitório,
normalmente alusivos a um tema para atrair a atenção das crianças.


Oficinas, um espaço de inclusão

Além das quatro horas do ensino formal, o projeto pedagógico da Escola
Estadual Fundamar inclui quatro horas diárias de oficinas. São aulas de fiação,
tecelagem, bordado, tricô, cerâmica, palha e cestaria, horta,marcenaria, música,
leitura, recreação dirigida e informática. Longe de ser uma mera ocupação de tempo,
as oficinas exercem um papel valioso na relação da criança com a escola e sua
aprendizagem.
“Se não houvesse as oficinas, 30% das crianças não se manteriam na escola”,
estima Maria Lúcia Prado Costa, coordenadora das oficinas. Independentemente da
atividade, são um importante espaço da inclusão.“É que nas oficinas mesmo as
crianças com dificuldade na escola formal podem ser brilhantes. Nesse momento,
elas recuperam a auto-estima e confiança em si mesmas e passam a ter um lugar no
seu grupo, como alguém que tem valor, tem o que dar. É comum que crianças
inseguras ou agressivas assumam novas posturas. Parece que estão procurando
identificar no que são boas. E, quando encontram suas competências,melhoram
inclusive nas aulas”, analisa a coordenadora.
Os educadores das oficinas consideram-se privilegiados por poderem estar mais
livres para se aproximar das crianças. Segundo a responsável pela oficina de
cerâmica,Maria das Dores Brito,“as crianças sentem-se à vontade para falarem de
todos os assuntos que quiserem. É uma oportunidade para aprenderem umas com as
outras, trocarem ideias e discutirem temas do seu interesse. As crianças conversam o
tempo todo. Parece que, se param de conversar, param também de produzir”.
Por outro lado, as oficinas revelam-se um espaço privilegiado para as educadoras
se vincularem com as crianças e perceberem novas demandas e problemas, como
violência doméstica, depressão ou tristeza.

Conteúdos e habilidades

As oficinas geralmente trabalham em torno de um tema comum, tais como as
comunidades indígenas de Minas Gerais, o Programa Fome Zero do governo federal
ou a gravidez na adolescência. Em 2003, a vida e obra do pintor Cândido Portinari
foi um dos temas que mais apaixonou as crianças e educadores, contagiando
inclusive as famílias dos alunos (leia mais nesta página.)
Às vezes, é o educador que estuda o tema e adapta para as oficinas. Outros são
pesquisados junto com as crianças. Elas percebem que nem mesmo os adultos
sabem tudo, que todos estão aprendendo e que existem formas de pesquisar para
saber mais.


AS CORES DE CANDINHO


Em 2003, o centenário do nascimento do pintor Cândido Portinari – ou

Candinho, como ficou conhecido entre as crianças – movimentou as oficinas da

escola, despertando os alunos para o universo de cores, personagens e cenas de

um dos maiores artistas brasileiros.Atraídos pela forte identidade caipira de

sua obra e história de vida, os educadores transformaram os quadros de

Portinari em uma nova possibilidade de valorizar e ampliar a percepção dos

alunos sobre a beleza e aspereza do mundo caipira.

O pontapé inicial foi o acesso a diferentes fontes de informação sobre o

pintor, com destaque para um CD-ROM cedido pelo Projeto Portinari e o livro

Crianças famosas: Portinari, de Nadine Trzmielina e Angelo Bonito.A partir daí,

as turmas pesquisaram a vida e o trabalho do artista, deparando-se com cenas

familiares, como os trabalhadores com os pés deformados nas lavouras do

café, as brincadeiras das crianças descalças, o casamento caipira, o espantalho,

a religiosidade popular... Revivendo cada tema, as crianças produziram seus

próprios textos, desenhos e esculturas, trazendo para dentro da escola e das

suas casas o encanto da arte.

Ao trabalhar um tema específico, os alunos lidam com conteúdos ligados às

mais variadas matérias. Fazer contas, decifrar códigos ou avaliar custos e

desperdícios são constantes lições de Matemática. História e Geografia aparecem

na busca da origem e contexto das atividades. As aulas de costura, bordado ou

tapeçaria, por sua vez, exigem atenção aos detalhes, leitura de legendas complexas

ou contagem de pontos.

Várias habilidades são desenvolvidas no decorrer das oficinas – da criatividade

à concentração, passando pelo domínio corporal e motor. Após participarem de

algumas oficinas, as crianças ficam mais centradas,menos dispersas. Quem está

em ritmo muito lento é chamado para ação, e quem está agitado se acalma.Muitas

vezes a turma fica tão envolvida nas oficinas que não quer sair para a recreação. O

interesse das crianças é a condição essencial para o desenvolvimento da oficina.

“Se não estão interessadas, temos que mudar a abordagem. Esse é o nosso desafio:

manter a criança sempre entusiasmada”, resume uma das educadoras.


Sustentabilidade

Cada oficina tem o desafio de se sustentar, comprando seu próprio material
com a venda de seus produtos. As crianças discutem a gestão da oficina, o custo
das matérias-primas, a quantidade da produção, o transporte, o desperdício do
material, entre outros assuntos. Na horta, por exemplo, foram discutidas as opções
em se trabalhar com bambu até decidirem pela fabricação de instrumentos.
Todas as oficinas procuram aproveitar material reciclado. Papéis de presente,
rolhas,materiais de construção, tudo pode ser reutilizado. Com eles, são inventados
objetos úteis para vender ou dar de presente nas festas comemorativas, como dia
das Mães ou dos Pais.

7. A relação com a família

Em seu projeto pedagógico, a Escola Estadual Fundamar assume uma relação
de parceira com a família, sem se sobrepor a ela ou substituir papéis e funções. Logo
na matrícula, no mês de janeiro, a família recebe uma visita domiciliar dos
assistentes sociais. Já na primeira conversa, a equipe tenta conhecer a família,
observar suas características e necessidades. Essas informações serão levadas em
conta no projeto pedagógico da instituição.
A família logo percebe a postura cuidadosa da equipe. Quando a criança
pertence à turma da Educação Infantil, por exemplo, é entregue na matrícula um
crachá com nome da criança, do acompanhante, do horário do ônibus e local de
descida.
A cada ano, a visita dos assistentes é repetida, reafirmando-se os laços entre a
escola e a comunidade. A equipe registra as mudanças de endereço, de trabalho e
da própria composição familiar. Acompanhar esse movimento é uma tarefa
essencial para a renovação pedagógica da escola.
No decorrer de todo o ano letivo, essa relação continua sendo alimentada. Nas
investigações realizadas pelas crianças e professores, por exemplo, a família sempre
aparece como personagem importante. O interesse em conhecer e pesquisar a
população que vive na zona rural implica em entrevistas com as mães, pais e avós,
coletando informações sobre sua origem, realizações, crenças e sonhos.
A família também se faz presente nas reuniões semestrais. Cada ciclo tem sua
própria reunião – uma para a Educação Infantil, outra para as primeiras séries do
Ensino Fundamental e mais uma para as últimas séries. A escola recebe os adultos,
e a presença de cada um é considerada essencial. Até mesmo o transporte para as
reuniões é garantido pelos ônibus escolares. E mesmo os homens não deixam de
comparecer. A presença dos pais e mães é de 100%, segundo os professores.
O objetivo é aproximar pais e mães da prática pedagógica, sendo escolhido um
tema geral para cada reunião. Este tema é explorado e aprofundado pelos
professores e alunos com o envolvimento das famílias e depois é apresentado e
debatido com os pais. No segundo semestre de 2003, por exemplo, o tema tratado
pela 4a série foi o do trabalho infantil. Além de pesquisar o assunto em livros e
revistas, as crianças foram perguntar para seus pais como era essa realidade na
época da sua infância. Junto com os professores, elaboraram uma opinião e
apresentaram o resultado para as famílias.
Durante a visita, os professores apresentam para os pais o programa do curso, e
as crianças, suas produções. Leem e explicam o que fizeram aos adultos. Os
educadores ressaltam o interesse dos pais pela aprendizagem da criança.Muitos
deles não sabem ler, nem têm os conhecimentos conquistados pelos meninos. As
reuniões também são transformadas em uma ocasião de integração entre as
diferentes famílias. Organiza-se uma feirinha, em que cada pai ou mãe pode vender
o seu produto, trocando dicas e informações.

O que dizem os pais

Os pais parecem valorizar especialmente a chance de seus filhos terem um
maior conhecimento sobre as coisas. Percebem que são saberes valiosos até
mesmo para o trabalho na roça, e demonstram querer para os filhos a escola que
não tiveram, vendo nela a oportunidade de um futuro melhor.

O que dizem as mães

Para as mães, a escola representa, acima de tudo, proteção. Enquanto
trabalham, a escola proporciona o cuidado e a atenção necessários para seus
filhos. Se há algum problema de saúde, não precisam se preocupar: quando
chegam, os primeiros atendimentos já foram feitos.
Em geral, as mães gostam muito da escola, considerada “grande e bonita”, com
espaço suficiente para seus filhos correrem e brincarem. Acham os educadores
acolhedores e carinhosos.Também ficam felizes porque as crianças gostam de ir
para a escola. Faça chuva ou sol, não faltam e muitas não entendem por que têm
que ficar em casa no fim de semana. As mães acreditam que, ao estudar, as
crianças ficam mais criativas e sabidas, e até os próprios adultos acabam
aprendendo com os filhos.

8. Rede de apoio

A proteção integral da criança orienta o projeto pedagógico da Escola Estadual
Fundamar para além da sala de aula. Consagrado no Estatuto da Criança e
Adolescente (ECA), o princípio da proteção integral estabelece a necessidade de
assegurar direitos da criança e de sua família visando ao seu pleno
desenvolvimento. Afinal, sem saúde,moradia ou alimentação, o próprio direito à
educação não se concretiza inteiramente.
Para efetivar esse atendimento, a Fundamar busca agregar e articular esforços
com outras iniciativas governamentais e não-governamentais para criar uma rede
de cidadania.

Parceria com o governo estadual

Um convênio com a Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais garante
o atendimento escolar da Educação Infantil ao Ensino Fundamental, além das
oficinas artísticas e a merenda escolar.

Parceria com o governo municipal

Prefeitura de Paraguaçu concede um ônibus para transporte dos professores e
a Prefeitura de Machado deu R$10.000,00 para transporte em 2003. O resto das
despesas com transporte, como aquisição dos veículos,manutenção, seguro e
combustível, é arcado pela Fundação 18 de Março. Ainda em parceria com esses
municípios, a escola manteve atendimento médico e odontológico durante alguns
anos em suas instalações. Atualmente, por não haver profissionais disponíveis,
encaminha as crianças com problemas para a rede de saúde de ambas as cidades
ou, havendo necessidade, para o hospital universitário da Unifenas, na cidade
vizinha de Alfenas.

Parceria com o governo federal

A escola participa do Projeto Bolsa-Escola, do Governo Federal, que proporciona
uma renda mínima para as famílias em situação de maior pobreza, com filhos
matriculados na escola.

Parceria com a Pastoral da Criança

Equipes da Pastoral da Criança atenderam 542 crianças em 2003, na faixa de
zero a seis anos em 11 comunidades rurais e urbanas. A equipe acompanha o peso
e desenvolvimento dos meninos e meninas, orientando as famílias sobre
amamentação, uso do soro caseiro e alimentação. A supervisora da Educação
Infantil da Fundamar, Cibele Ercílio Pinto Costa, é a coordenadora da Pastoral da
Criança em Paraguaçu.

Parceria com a rádio local

Por uma articulação da Pastoral da Criança, a escola tem voz garantida na
programação da rádio de Paraguaçu.Todo sábado, ao meio-dia, ela veicula
campanhas preventivas, orientações de saúde, bem como as notícias e
reivindicações da escola e das comunidades que ela atende.

Parcerias profissionalizantes

Visando à continuidade dos estudos dos seus alunos, a Fundamar buscou
firmar parceria com instituições de ensino profissionalizante, como a Escola
Agrotécnica Federal de Machado. Além de oferecer vagas no Ensino Médio, a Escola
Agrotécnica promove cursos profissionalizantes e de Informática.

Mutirão ecológico

Com a participação de toda a equipe pedagógica, a escola desenvolve projetos
ambientais, incluindo campanhas de vacinação de animais domésticos, coleta
seletiva de lixo em determinados bairros, limpeza de áreas públicas, entre outras
ações.



TRANSPORTE: SEM ELE, NÃO HÁ ESCOLA

No mundo rural, o ir e voltar da escola é uma questão crucial que, muitas
vezes, impede o direito à educação das crianças. Sem opção de transporte,
meninos e meninas se arriscam andando a pé pelas estradas até a escola mais
próxima – geralmente na cidade.Muitos acabam desistindo e adiam o sonho de
estudar.
Desde o início, a Fundamar decidiu enfrentar essa dificuldade, buscando
parcerias com as prefeituras dos municípios vizinhos. Conseguiu organizar um
sistema de transporte gratuito e eficiente, com horários conhecidos por todos.No
total, cinco ônibus transportam diariamente as crianças, os educadores e os
funcionários, como também as famílias em dias de reunião ou festa. Um dos
ônibus pertence à Prefeitura de Paraguaçu, e os outros quatro, à Fundação 18 de
Março.
Os ônibus aparecem pontualmente no local combinado, recebendo a
confiança da família.No papel de educadores, o motorista e seu acompanhante
fazem o elo cotidiano entre as famílias e a escola. Ouvem as preocupações,
recebem recados e recomendações. Para subir no veículo, ou descer dele, as
crianças contam com o cuidado dos irmãos mais velhos e adultos presentes.Nem
todos os pais conseguem acompanhar os filhos,mas têm a certeza do apoio do
grupo.Ao chegar, crianças e professores andam em pequenos grupos para as suas
casas.
Como uma extensão da escola, o ônibus favorece um espírito de respeito e
apoio mútuo. O ir e vir torna-se uma oportunidade pedagógica de estimular a
autonomia e a responsabilidade das crianças.



A EDUCAÇÃO INFANTIL

Desde os primeiros anos, a Escola Estadual Fundamar foi pioneira na região ao
garantir o direito à Educação Infantil para as crianças das famílias do campo. Essa
conquista representa grande impacto não só na vida da criança,mas de toda sua
família. Com a tranquilidade de ver seus filhos pequenos cuidados pela escola, as
mulheres podem buscar alternativas de renda e trabalho, conquistando autonomia,
auto-estima e um novo espaço social. Ao mesmo tempo, é ampliada a rede de
proteção à criança, prevenindo inclusive o trabalho infantil. Em vez de acompanhar
suas mães até a roça, as crianças percebem desde cedo que seu lugar é na escola.
Por outro lado, a existência de vagas na Educação Infantil garante que os filhos
mais velhos continuem seus estudos, sem ter que substituir os adultos no cuidado
dos irmãos ou no sustento da casa.
Segundo as concepções educacionais mais recentes, ao participar de uma
escola de Educação Infantil de qualidade, a criança torna-se mais sociável,
autônoma, adquirindo novo vocabulário, conhecimentos e habilidades para
vivências futuras. Na Fundamar, os educadores não hesitam em destacar esses
ganhos nas crianças. Em contato com um ambiente alfabetizador, que não é
comum na zona rural, as crianças são estimuladas por novas experiências,
apresentam melhor desenvolvimento sensorial, motor, simbólico, afetivo e social.
A criança encontra na escola um espaço de convivência e descobertas, pleno
de afeto, cuidado e estímulo. Pode ir e ficar junto com seus irmãos, além de conviver
com outras crianças de diversas idades.“A criança do campo quando não vai à
escola”, relata uma das educadoras,“fica isolada, só com a mãe, num universo
social e cultural mais limitado e pobre. Na escola, a criança pode se relacionar e
conciliar natureza e cultura, horta e computador, internet e fogão a lenha. Desde
cedo, aprende a se expressar pelas palavras, desenhos, sons e jogos de faz-de-conta.
É provocada a pensar e fazer.”


LINHA DO TEMPO: A EDUCAÇÃO INFANTIL NA ESCOLA ESTADUAL FUNDAMAR


1984 - Desde a criação da Escola Estadual Fundamar, a comunidade local

apresentou a demanda por um atendimento às crianças pequenas. Já na

primeira sala multisseriada faziam parte da turma crianças de seis

anos entre as maiores.

1985 - Com a criação de salas separadas por idade, forma-se uma turma para

crianças entre quatro e seis anos de idade.

1986 - Chegam à escola meninos e meninas entre um ano e meio e três anos.A

partir daí, são criadas salas, rotinas e equipes para atender ao grupo. O

atendimento é custeado pela Secretaria de Estado da Educação de

Minas Gerais.

1988 - A Constituição Federal reconhece a Educação Infantil como direito das

crianças brasileiras.

Anos 90 - A população matriculada na Escola Estadual Fundamar

varia ano a ano, chegando a formar duas turmas de cinco anos e

duas de seis, somente com crianças da zona rural.

1996 - A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) estabelece a Educação

Infantil como parte da educação básica.

1997 - Entra em vigor a política de municipalização do atendimento de

Educação Infantil. Diante da dificuldade das prefeituras locais, o governo

estadual mantém seu apoio ao projeto da Escola Estadual Fundamar.

1999 - Ano marcado por uma retração das matrículas. Por falta de trabalho,

muitas famílias rurais se dirigem para as periferias das cidades,

especialmente Paraguaçu. A escola decide expandir sua matrícula para

as crianças da periferia da cidade.

2002 - O projeto de Educação Infantil da Fundamar recebe o Prêmio Criança,

concedido pela Fundação Abrinq.

2003 - Assim como os demais ciclos da escola, a Educação Infantil atende 70%

de crianças residentes na zona rural e 30% na periferia urbana.


1. Proposta pedagógica

Desde sua criação, o atendimento da Educação Infantil foi mudando de espaço.
Atualmente a creche está situada numa antiga casa de colono com uma sala
ampla e um banheiro aquecido por energia solar. Os educadores e coordenadores
pleiteiam a construção, no futuro, de um lugar mais amplo e, portanto,mais
adequado para o projeto proposto.
Do ponto de vista pedagógico, a Educação Infantil viveu muitas mudanças de
supervisão tanto pela Fundação 18 de Março quanto pela Secretaria de Educação
de Minas Gerais. A proposta atual apoia-se nas concepções do próprio coletivo
formado pelos educadores e a supervisora. A partir de suas observações e
conhecimentos, o corpo docente constrói teorias e práticas pedagógicas
sintonizadas com as demandas e propósitos desejados.
O trabalho parte de concepções de infância, criança e educação bem definidas,
conforme apresentadas a seguir.

Concepção de infância

“Muita magia e muita sorte têm as crianças que conseguem ser crianças”, diz o
escritor uruguaio Eduardo Galeano. Essa ideia inspira os educadores da Fundamar,
que reconhecem a infância como um período fundamental da vida que deve ser
vivido em sua plenitude, preservado e lembrado. Na infância, a criança deve viver
como criança, respeitando suas possibilidades de desenvolvimento. Deve se
preservar o colo, o aconchego, a história e o sonho. Inclusive na escola, a infância
deve ser vivida dessa forma, precisando encontrar no dia-a-dia escolar espaço para
ser criança. Ela precisa conviver com outras crianças, fazer amigos, ter colo e afeto
quando precisar, poder se entregar às descobertas de um mundo cheio de
surpresas e aventuras divertidas,mágicas.
O brincar é percebido como estratégia de desenvolvimento e não como perda
de tempo ou mera distração. Os educadores defendem lugar garantido para os
brinquedos da tradição local (bilboquê, bonecas de espiga de milho, papagaio,
cantigas de roda etc.), assim como para as novidades de cada tempo.“Mais do que
comprar, devemos incentivar o criar”, sintetiza uma das professoras deste ciclo.

Concepção de criança

A criança é vista como sujeito de direitos, com identidade própria. Ao chegar à
escola, ela traz consigo uma cultura familiar a ser respeitada. Espera-se que possa
criar o mundo a partir de sua perspectiva, ser ouvida para ter a possibilidade de
produzir novas construções e, se for o caso, virar pelo avesso a ordem das coisas. O
centro dessa reflexão é entender cada criança como única.
Na fala da equipe, a criança sempre aparece como protagonista, cheia de vida,
sempre em ação e movimento. No seu processo de aprendizagem, busca-se
estimular sua curiosidade e interesse pelo mundo. Assim ela própria pode ampliar
suas referências, construir e desconstruir a realidade, criando novas histórias.


EDUCAÇÃO INFANTIL EM 2003



Turma/classe
Número de professoras*
Número de crianças
Turma de 18 meses a três anos
02
30
Turma de quatro anos
02
30
Turma de cinco anos
02
30
Turma de seis anos
02
20
TOTAL
08
110
* Cada professora trabalha diariamente um período de quatro horas e quinze minutos. 


Concepção de Educação Infantil

Para os educadores da Fundamar, a Educação Infantil deve permitir e estimular
que a criança seja ela mesma e não precise ser adulto antes do tempo. Deve
encontrar a oportunidade de movimento e crescimento, sentindo-se à vontade para
descobrir o mundo e arquitetar seu próprio espaço. Deve se sentir segura para agir,
ter iniciativa e se desenvolver. E, especialmente, deve ter acesso ao mundo dos
saberes e brincadeiras.
A ludicidade tem papel central na pedagogia da escola. Os primeiros anos da
vida escolar devem se transformar numa oportunidade de aprender e se divertir com
as brincadeiras e também de descobrir o acervo cultural das letras, música ou artes
plásticas. Deve ser um espaço coletivo, onde as individualidades possam brotar e se
desenvolver. É um espaço de interação com as outras crianças e adultos.



A criança, segundo os educadores da Fundamar

Concepção construída durante o processo de sistematização.
Criança é especial, carinhosa, meiga, amiga, ativa, alegre, arteira, esperta. Simples.
Criança gosta de ser livre, sorrir, cantar, dançar... de estar em movimento o tempo todo; de expressar o que gosta e o
que não gosta; de expressar o que faz em casa; de ser tratada como criança; de ser tratada com dedicação e respeito.
Criança está aberta para o novo, motivada e interessada em aprender; disposta a criar, usar a imaginação, soltar o
lado artístico. 
Criança sente prazer em vir para a escola.


2. Valores do cotidiano

O cotidiano da Educação Infantil na Escola Estadual Fundamar persegue
valores claros, zelando por práticas consideradas essenciais:

Equilíbrio da rotina

Para os educadores, a rotina é um elemento fundamental no cotidiano da
criança. É a organização básica dos horários do dia que faz com que a turma se
oriente sobre o que vai acontecer, o que vem depois, qual a hora de brincar, comer,
ouvir histórias, ir ao parque, conversar, dormir e voltar para casa. Assim, ela vai se
organizando no tempo, percebendo continuidade e sequência nos acontecimentos,
antecipando situações.
A rotina garante o que é fixo, dando a segurança do conhecido.Mas, ao mesmo
tempo, segundo os educadores, é fundamental acolher as novas necessidades das
crianças. O que elas trazem a cada dia pode – e deve – promover mudanças na
estabilidade. O educador, portanto, precisa saber lidar com as mudanças, tanto as
anunciadas, como as inesperadas.

Ritmo e dinamismo

Diante da pouca capacidade de permanência da criança numa mesma
atividade e lugar, os educadores estão sempre prontos para mudar e acompanhar o
ritmo das crianças. O contar história vira desenhar, que vira dramatizar, que vira
reescrever a história. A maleabilidade das atividades não significa, entretanto, que
cada uma delas não tenha começo,meio e fim.

Espaço para movimento

O movimento faz parte do jeito de ser e estar das crianças. Assim, os
educadores buscam conduzir as atividades, permitindo que a turma se movimente
enquanto produz. Elas levantam,mostram o que estão fazendo, sentam,
gesticulam... De qualquer maneira, não é um movimento sem limites. Estabelecer
essas regras é um desafio árduo e constante para a equipe.

Importância do falar

O silêncio não é imposto como regra absoluta e constante para a turma.
Certamente, há momentos em que não se deve falar para poder escutar. Mas, de
forma geral, as crianças são estimuladas a compartilhar suas opiniões com os
colegas, contar o que estão fazendo, o que descobriram e estão sentindo.

Afeto e acolhida

É notório o clima de cooperação existente entre os adultos. Os professores
dizem se sentir apoiados, uns aos outros e também pela supervisora. Com a autoconfiança
fortalecida, sua atuação se potencializa.
Da mesma forma, todos apoiam as crianças em atitudes constantes de respeito
e consideração: se prontificam a ouvi-las e compreendê-las nas suas necessidades.
“A escola é das crianças”, dizem os educadores. Elas trazem características culturais
e jeitos de ser individuais que devem ser respeitados. O apoio afetivo funciona como
alicerce fundamental para outras aprendizagens.

Responsabilidade e autonomia

São dois valores cultivados constantemente pelos educadores. As crianças são
solicitadas a levar mensagens, buscar material, circular pela área da escola para
saber se orientar e movimentar sozinhas. Desde cedo, também aprendem a se
vestir, comer, cuidar da própria higiene e do material escolar.

Roda de conversa

Talvez o momento mais importante do dia, segundo os professores, é a roda de
conversa com as crianças, que acontece pelo menos duas vezes por dia – uma de
manhã e outra à tarde. Juntos, conferem a turma, percebem quem está presente,
quem faltou, combinam o que vão fazer.Também relatam situações de suas casas,
discutem ideias, resolvem conflitos, cantam, brincam, ouvem histórias. É o momento
da construção de pertencimento ao grupo.Todos têm espaço para falar e ouvir,
favorecendo a troca.

Brincadeira livre

A escola respeita a necessidade diária de as crianças brincarem livremente.
Nessa hora, os professores podem observar as escolhas de cada um, os grupos que
se formam espontaneamente, além das preocupações, interesses e conflitos
presentes.

Contando histórias

Outro momento que merece atenção dos educadores é o da roda de histórias. A
leitura de diferentes narrativas amplia o repertório da turma trazendo novos
contextos, sentimentos e situações a serem imaginadas e resolvidas. Algumas
causam tal identificação – como a História dos sete cabritinhos, dos Irmãos Grimm
– que as crianças não cansam de ouvir e sempre pedem para que seja repetida.
Muitas são incorporadas na vida real, inspirando brincadeiras, desenhos e
conversas. Na avaliação dos educadores, o ler e ouvir histórias revela-se uma
maneira eficiente de desenvolver a atenção coletiva e a criatividade.

Leitura e escrita

A Fundamar não tem como objetivo alfabetizar as crianças na Educação
Infantil. Mas tem a preocupação de atraí-las para o mundo da leitura e da escrita,
que raramente faz parte da vida familiar.
Diariamente, as crianças têm contato, das mais variadas formas, com as letras e
os números.Todos os objetos da sala, por exemplo, são identificados. Os nomes das
crianças também são escritos e reconhecidos. Bilhetes circulam entre as diferentes
classes e setores da escola, bem como entre os professores e as famílias.Todos são
lidos para as crianças. O calendário, o relógio, o cardápio, cada detalhe se
transforma em oportunidade de aprendizagem.
Tampinhas, palitos, bolas ou cobras de massinha são usadas para contar, criar
categorias e organizar. Baralhos, dominós, bingos são brincadeiras que despertam o
raciocínio, a compreensão e o respeito de regras. Saber “quantos somos”, quem veio
e quem faltou também é outro jogo diário. Os problemas encontrados nas histórias
são propostos para as crianças, que se sentem instigadas a buscar respostas.

Valor do erro

Os educadores entendem o erro como uma hipótese que não deu certo. O
caminho deve ser, então, reconstruído. É permitido errar e refazer, sem sentimento
de fracasso. Da mesma forma, se a criança quebra algum objeto ou deixa algo cair,
não vai receber necessariamente uma bronca ou castigo. É um acidente, que deve
ser evitado, exigindo mais atenção e cuidado.Mas é algo que acontece e o mundo
não precisa vir abaixo.

3. Novos desafios

Ao refletir sobre as necessidades percebidas entre as crianças, os educadores
da Escola Estadual Fundamar apontam desafios que devem nortear novas soluções
pedagógicas:

Fortalecimento familiar

Muitas crianças vivem em casa situações de conflito, que se refletem
diretamente no seu desenvolvimento, como a separação dos pais, o alcoolismo, a
violência ou a falta de acolhimento afetivo. O educador precisa aprender a lidar e
superar sua sensação de impotência. Ao mesmo tempo, é essencial fortalecer a
relação com as famílias para prevenir e buscar encaminhamentos para os problemas
apresentados.

Comunicação regular

Os educadores estão buscando alternativas para intensificar a comunicação
cotidiana com as mães e os pais. Diferentemente de outras unidades de ensino da
região urbana, na Fundamar os familiares não vão diariamente à escola levar e
trazer os seus filhos. Ao mesmo tempo, muitos têm dificuldade de leitura,
complicando a compreensão e a troca de bilhetes e recados.

Acolhimento inicial

A chegada das crianças pequenas no início do ano merece uma atenção
especial. Afinal são muitas mudanças: separar-se dos pais, passar o dia todo longe
do convívio familiar, adaptar-se aos novos espaços, rotinas e relações. O período de
adaptação é difícil, inclusive para os próprios adultos da família.

Adaptação às regras

A compreensão e aceitação das regras da escola, da turma e dos adultos não
são imediatas. Os educadores precisam reconhecer a capacidade e a dificuldade
próprias de cada faixa etária.Torna-se essencial redobrar a paciência e a
flexibilidade para combinar, repetir e legitimar as regras junto às crianças.




FUTURO DA CRIANÇA NO CAMPO

Apesar do compromisso em construir uma proposta pedagógica diferenciada e
garantir a proteção integral à criança, os educadores da Escola Estadual Fundamar
demonstram grande angústia ao pensar sobre o futuro da criança do campo.
Sentem incerteza e impotência.“O futuro da criança do campo está muito vinculado
ao futuro do campo”, aponta Maria Lúcia Prado Costa.“Se o campo começar a
oferecer condições para que as pessoas possam trabalhar, criar os filhos e ter
sonhos, acredito que há como se pensar num futuro. É necessário desenvolver
outras formas de geração de renda menos agressivas e hostis com as pessoas e a
natureza. Só então será possível conciliar o fogão a lenha com a internet, o adubo
orgânico com o lucro da safra. Caso contrário, o futuro da família do campo será
sair dele e tentar se adaptar ao mundo urbano.”
Os educadores reconhecem que a discussão é complexa. O objetivo inicial da
Fundamar era fixar o homem no campo. Hoje já não acreditam que isso vá se
realizar, embora esperem que o jovem do campo encontre seu espaço, podendo ser
protagonista de sua história.Mas sabem que muitos ficarão no meio do caminho,
nem cá, nem lá. Não voltarão para a roça, não retomarão a cultura caipira e a
rusticidade do campo, nem irão para as cidades com um desenvolvimento cognitivo
mais elaborado. Com um pé em cada lugar, tentarão se equilibrar entre dois
universos bem distintos.
Até pouco tempo, a maior parte dos alunos que saía da Fundamar, ao
completar a 8a série, não continuava os estudos. Além da dificuldade do transporte
até a escola na cidade,muitos começavam a trabalhar, ficando sem tempo para
estudar. Nos últimos anos, entretanto, a situação mudou muito. Dos 52 alunos que
se formaram em 2002 no Ensino Fundamental, por exemplo, apenas seis não
ingressaram no Ensino Médio, clara demonstração de que a maioria já percebe que
é desejável continuar os estudos, mostrando maior segurança, auto-estima e
preparo para encarar as exigências do segundo grau.Mas não há certeza de que
conseguirão ir até o fim. Entre outros problemas, os livros são caros e o transporte
ainda é um desafio. Ao mesmo tempo, permanece uma expectativa familiar e social
de que os meninos, após o Ensino Fundamental, comecem a trabalhar na roça e as
meninas, em casa.

O que a escola está fazendo

Os educadores acreditam que a escola contribua de alguma forma no
enfrentamento dos conflitos e dificuldades das famílias que vivem no campo. A
primeira estratégia é trazer a discussão para dentro da sala de aula, fortalecendo a
reflexão dos alunos sobre sua condição, procurando dar voz para que as crianças e
os jovens falem de si, da relação das pessoas do campo com o trabalho, da violência
em casa e de tudo que os afete.
A escola afirma-se, assim, como um espaço de reflexão e troca onde as crianças
podem saber que as coisas têm uma causa, não acontecem só com eles e estão
relacionadas a processos políticos, econômicos e sociais mais amplos. Além de gerar
reflexão, a escola busca oferecer aos alunos estratégias para descobrir e entender
melhor a si próprios e aos outros; fortalecer-se afetiva e intelectualmente; desenvolver
variadas formas de expressão; e sempre pautar-se em princípios éticos, aprendendo a
pensar, tomar posição e fazer escolhas pensando em si e na coletividade.
Alerta aos crescentes desafios, a Fundamar tem renovado e ampliado suas
propostas pedagógicas. Ao mesmo tempo que as crianças têm contato com a horta,
aprendem a lidar com o computador. Paralelamente, a escola tem oferecido vários
cursos pontuais, como eletricidade, horta orgânica, manicure ou alimentação
alternativa, sem esquecer o incentivo constante à continuidade dos estudos.

O que mais a escola pode fazer

Os educadores sentem a necessidade de ter mais tempo para ouvir e estar com
as crianças e jovens. Precisam se desdobrar para garantir as condições básicas do
atendimento, que deviam estar asseguradas pelas políticas públicas,mas raramente
estão. Faltam o médico, o dentista, o material escolar, o transporte... Por outro lado,
as solicitações administrativas e burocráticas do dia-a-dia roubam mais tempo do
que seria desejável.
Mas há um lado positivo nesse esforço. É importante que meninos e meninas
acompanhem as lutas do grupo para alcançar o que é direito deles.Talvez esta seja a
melhor aprendizagem que uma escola possa dar a seus alunos: a consciência e a
conquista dos próprios direitos. É essa força de articulação, dizem os educadores, que vai
fazer com que as comunidades rurais ou urbanas melhorem suas condições de vida.



CONCLUSÃO

Em muitas das reflexões sobre os dilemas enfrentados na Fundamar, questões
sobre a infância e sobre a população do campo se entrecruzaram. Nesses
momentos os educadores se perguntavam:“Existe, atualmente na vida moderna,
lugar para a infância?”“Qual o lugar dessa população diante do processo da
mecanização da lavoura?” Nessas discussões, os educadores assumem que ambos
estão perdendo, com muita rapidez, lugar no mundo moderno.
Alguns estudiosos da criança vêm denunciando o gradual desaparecimento da
infância. A mídia, a televisão, a internet e o acesso das crianças às informações
dirigidas ao público adulto estariam ameaçando expulsar as crianças do jardim da
infância. Entretanto, outros pensadores ampliam esta questão. É a infância que está
desaparecendo ou seria esta uma crise do homem contemporâneo?
A criança está mergulhada nesse processo sociocultural, absorvendo e sendo
formada na cultura que está ao seu redor. Deparamo-nos, hoje, com uma cultura
marcada pela violência, com situações de ausência de solidariedade, tráfico de
drogas, fome, falta de moradia, ausência de privacidade e exposição de intimidade.
Esses acontecimentos estão presentes em todas as casas, na vida das crianças e
adultos, a qualquer hora do dia, na cidade ou no campo. Parece ser constrangedor
para o adulto lidar com o espanto da criança diante da violência e da exposição
inadequada da intimidade, quando ela pergunta:“O que está acontecendo? Por
quê?” Ele mesmo, assustado, não sabe responder.
Mas a qual infância exatamente nos referimos? Qual é a infância que estaria
desaparecendo? Segundo dados do Unicef, 80% das famílias brasileiras que
possuem crianças até seis anos ganham até dois salários mínimos mensais. Sendo
assim, terão tido essas crianças uma infância preservada? Teriam seus direitos
básicos reconhecidos e garantidos?
Há, portanto, uma situação mais grave e importante de ser reconhecida. A maior
parte das crianças brasileiras nunca chegou a ter uma infância preservada. Na zona
rural, assim como nos setores mais empobrecidos das cidades, a situação ainda se
mostra mais aguda, e a vivência da criança pequena pode ser bastante cruel.
Nesse contexto de privações, a Educação Infantil de qualidade se constitui em
um projeto de proteção à infância. Na escola, além de alimentação e de cuidados
básicos, a criança tem um atendimento apropriado às suas necessidades, ao seu
momento de vida, tendo a oportunidade de brincar, explorar e descobrir o mundo
físico, ter contato com livros de história e com o faz-de-conta, construir, inventar,
imaginar, se expressar de várias formas, fazer amigos, aprender as brincadeiras
tradicionais etc.
Entretanto, para ter um bom desempenho, a escola de Educação Infantil precisa ter
qualidade, profissionais especializados com formação constante, espaço físico
organizado em instalações salubres e uma proporção educador/criança adequada
que permita a atenção individualizada necessária.
Outra preocupação dos educadores da Fundamar se refere ao desaparecimento
da cultura do homem do campo, ao esvaziamento do pertencimento de quem vive
da produção agropecuária. Este, para sobreviver, precisa mudar de residência
constantemente, à procura de trabalho, ou migrar para as cidades. Com isso, sua
sabedoria de vida está desaparecendo rapidamente.As tentativas de trazer a
modernidade para o campo, tal como se vive no mundo urbano, acentuaram a
descaracterização do ambiente rural, sem gerar novas oportunidades de vida.
Segundo o sociólogo Rui d’Espiney, coordenador nacional de projetos rurais de
Portugal, a crise no campo é estrutural e superá-la não se dará por um retorno ao
passado nem pela reconstituição da velha ordem ou, ainda, pela possibilidade de
anulação das causas que provocam essa crise, a começar pelo efeito da expansão
da economia de mercado e da transformação ocorrida nas relações de produção e
na estrutura da propriedade. É inevitável aceitar as mudanças nos modos de vida e
nas formas de produção de riqueza, e a qualificação da atividade agrícola (11).
Segundo discussões dos estudiosos do desenvolvimento rural, é importante
considerar os seguintes aspectos dessa questão:
_ A necessidade de se fortalecer ou se criar uma rede articulada e
integrada de serviços, ou seja, a integração dos serviços que compõem a
vida comunitária (educação, economia, saúde, cultura). Essa integração
possibilita que os atores sociais deste universo definam caminhos que
favoreçam um reencontro com a própria identidade – ou sua reconstrução.
_ O processo de construção do futuro no ambiente rural deve assegurar
sua sustentabilidade, realçando o seu saber e suas diferenças, com poder
competitivo, sem contrapartida no mundo urbano.
_ É indispensável promover qualidade de vida traduzida pela modernidade
sem que isso se coloque em contradição com o jeito de ser do homem do
campo. É preciso absorver o novo.
Utilizando-se da memória como forma de reconstruir as histórias pessoais,
preservar as identidades, provocar sentimento de pertencimento e fortalecer a
cultura local, a Escola Estadual Fundamar se apoia em parâmetros sólidos e, até
certo ponto inovadores, sobre a aprendizagem, como:
_Os conteúdos a serem trabalhados partem da cultura e dos saberes dos
alunos e suas famílias. Os alunos participam de um movimento de
investigação sobre si próprios e seu contexto familiar e espacial.
_A realidade é problematizada e o aluno usa de sua criatividade para
buscar soluções, uma vez que não são apresentados modelos prontos.
_Todos são aprendizes, embora com níveis de saberes diferentes. Alunos
e professores se sentem autores da construção do seu conhecimento,
apoiados entre si e pela supervisão.
_A escola é prazerosa, porque aprender é interessante, deve ser fonte de
alegria, não de pressão ou castigo.
_ O processo de pensamento do aluno é objeto de estudo coletivo dos
professores.
Assim, a Escola Estadual Fundamar traz no seu fazer cotidiano a esperança da
solidariedade, da generosidade, da justiça social, do reconhecimento de que as
pessoas podem, mesmo sendo diferentes e vivendo realidades diferenciadas, buscar
juntas novas saídas para construir uma vida melhor, na cidade ou no campo.
Em um país de grandes dimensões como o nosso, no qual os centros urbanos
vêm sendo pressionados por um contínuo fluxo migratório vindo da zona rural, a
oferta de uma educação pública de qualidade no campo tem efeito e função
altamente estratégicos.Ao possibilitar à criança da zona rural estímulos, informações
e uma aprendizagem qualificada, a Escola Estadual Fundamar contribui, em sua
pequena escala de ação, para reverter o ciclo perverso de exclusão e fluxo do campo
para a cidade. E ao publicar essa experiência, a Fundação Abrinq espera contribuir
com a sua disseminação, semeando essa boa iniciativa por outros campos.

(11) Rui D’Éspiney, Educação, desenvolvimento e cidadania: fundamentos de uma intervenção alternativa em meio rural, Portugal, 2003.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRANDÃO, Carlos Rodrigues.Pesquisa participante. São Paulo, Brasiliense, 1990.
CANDIDO, Antonio. Os parceiros do Rio Bonito. São Paulo, Livraria Duas Cidades,
1987.
COSTA, Maria Lúcia Prado. Fontes para a História Social do Sul de Minas: Os trabalhadores
de Paraguaçu e Machado (1850-1900). Belo Horizonte, Mazza, 2002.
FUNDAÇÃO 18 DE MARÇO. História pedagógica da Fazenda-Escola Fundamar.
Paraguaçu. Dig. 1998 c/ atualizações.
Memorial das oficinas da Escola Fundamar: um projeto de arteeducação
para alunos da roça. Paraguaçu. Dig. 1997.
Relatórios dos Cadernos de Estudos Sociais. Paraguaçu. Dig. 2003.
LABRIOLA, Isabel.“Do Analista-Caipira ao Caipira Analista”,in XIII Moitará, República
do Pica-Pau Amarelo, arquétipos da cultura caipira, Campos do Jordão, SBPA, 1999.
SANTOS,Milton. O espaço do cidadão. São Paulo, Studio Nobel, 2002.
 

As monografias e outros trabalhos sobre a Escola Estadual Fundamar de autoria de Maria Lúcia Prado Costa podem ser encontrados no site da instituição (www.fundamar.com.br).  







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